quinta-feira, 5 de setembro de 2013

O voto aberto no legislativo

                        


      A pressão popular que fervilha no Brasil levou a Câmara dos Deputados a aprovar, nas últimas horas da sessão de terça-feira, 3,  o voto aberto em todas as votações dos poderes legislativos: Senado, Câmara Federal, Assembleia Distrital, assembléias legislativas e câmaras de vereadores.  Já era tempo. O eleitor tem direito de saber a posição dos parlamentares em todos os procedimentos no exercício do mandato.

         O espírito dessa decisão abrange naturalmente as escandalosas sessões secretas, muito comuns nas câmaras municipais, aonde os vereadores vão ao plenário com decisões acordadas fora dos olhos do público que tenta acompanhar as posições de seus “representantes”, sobretudo nas questões polêmicas.  O caciquismo nos municípios impõe unanimidades que ferem o principio da representatividade e da proporcionalidade. É muito comum vereadores terem parentes ou amigos como funcionários públicos, que ficam sujeitos a perseguições se o edil der um voto contrário ao interesse dos chefes das máquinas administrativas. Em outras ocasiões, há também a troca de vantagens, ou o voto simplesmente comprado nos bastidores da corrupção.

         Mas é preciso cuidado com essa classe política. A votação da Câmara, que corresponde a uma dentre muitas razões dos clamores das ruas, depende de tramitação no Senado.  Na quarta-feira, 11, a Comissão de Constituição e Justiça daquela casa “deve votar a proposta de Emenda à Constituição (PEC) que estabelece o voto aberto no Congresso”, conforme notícia de hoje da Agência Brasil.  O relator Sérgio Souza(PMDB-PR) “disse que vai defender o voto aberto em todas as situações. Mas ele admite que, como não há consenso sobre o tema, a saída pode ser limitar o voto aberto a casos de cassação”.   Se ele disse isto, o espírito de corpo da Câmara Alta já se manifestou assim.  Isto é um verdadeiro “espírito de porco”.  Se ficar restrito apenas aos casos de cassação de mandato, praticamente anula a essência do voto aberto.  O voto secreto tem que ser uma prerrogativa do eleitor.  Os seus representantes, pelo contrário, têm que sempre votar de maneira clara, transparente, com posição aberta a toda a sociedade.  Se ele representa, em tese, uma parcela de eleitores, ou determinado partido, fundamentalmente está agindo sobre os interesses e necessidades de todos, dos quais recebe seus proventos derivados dos impostos de cada um.

         Há que se lembrar: por causa dessas manobras e casuísmos o povo vem ocupando as ruas com a cara dos jovens.  Cada manifestante representa no mínimo cinco pessoas que por razões diversas não podem ou não devem se expor.  Eles, na verdade, representam mais do que os parlamentares.  Estão nas manifestações independentes de financiadores.  Suas posições decorrem da insatisfação de pais, irmãos, avós e amigos que sofrem as agruras do abuso de poder.  E representam o desejo de situação melhor e mais justa para as novas gerações. 

         Somente em Brasília há expectativa de mais de 50 mil manifestantes neste Sete de Setembro. Todas as capitais e cidades onde a população desfruta de relativa liberdade, a tendência é a mesma.  E essa liberdade é relativa mesmo. A repressão dos vândalos que ocupam o poder está de prontidão para criar pretextos e até forjar situações para usarem a violência contra os manifestantes.  A escola da Ditadura Militar deixou discípulos com sede de sangue e ânsia de vampiros especializados em tortura.

         As sessões de todos os poderes legislativos deveriam ser transmitidas ao vivo pela televisão, por rádio, e sob os olhos de toda a imprensa escrita e virtual.  Serviria para a politização de todos os segmentos sociais e vigilância de quem não possa presenciar a movimentação dos plenários.

         Enquanto houver voto ou sessão secreta, a democracia será uma farsa de imagem sagrada conduzida por metafóricos fariseus; ou hipócritas sem metáfora.

         Dá para perceber que a desgastada classe política ainda tenta iludir o povo descontente,  com aparentes medidas moralizantes.  Tentam dar com uma mão e tirar com a outra.  Fazem uma jogada para a platéia e outra para a bilheteria, ou para os cartolas da política, principalmente os financiadores de campanha.

         Diante de tudo o que vem acontecendo, é preciso o olhar vigilante e desconfiado da população cansada dos jogos de cena.  O povo luta e se posiciona por resultados que venham a se refletir na mesa do trabalhador, na sua morada, na educação, no seu direito de escolha e no poder compra, com o semblante altivo e a auto-estima elevada.

         Como sempre, no município tudo tem maior clareza.  O teatro político é apenas um pequeno foco de toda a ribalta dessa ópera gigantesca do cenário nacional. 

         Se o Senado mudar a essência do voto aberto, o clamor das ruas poderá se transformar em estrondo. Não porque esteja aí a solução das questões sociais do país. Mas por causa do abuso continuado dos legisladores que pensam estar o povo cochilando com o afago de uma notícia mais amena.

         Pelo contrário, a cada notícia de um ato melhor praticado por esses atores, ocorre paralelamente a desconfiança popular.  É o dito: “cão mordido por cobra, tem medo até de linguiça”.  Dessa alcatéia não se pode esperar surgir cordeiro de uma hora para outra.

         A desconfiança é o estado de espírito reinante no momento.  A punição dos mensaleiros pelo Supremo Tribunal Federal faz o povo pensar: até aonde vai isto?.  Há diminuições de penas que caem na modalidade de ”penas alternativas”.  As formações de quadrilha, os peculatos, os prejuízos aos cofres públicos despertam no povo a curiosidade de saber se haverá reparação, ressarcimento.   Todos se lembram do caso Juvenil Alves, um dos expoentes do Mensalão.  Não há notícia se o que ele recebeu indevidamente como Deputado foi devolvido aos cofres públicos, nem se os seus atos praticados como “deputado cassado” foram anulados.

         Com a lentidão da justiça, a presunção da inocência, os recursos das liminares, quando se chega à situação do crime transitado em julgado com condenação do réu, se não houver reparação, o crime compensa, mesmo se premeditado para jogar com os recursos judiciais.

         Estas reflexões vêm a propósito de tanta coisa que tem de ser modificada na abrangente Reforma Política, para sonharmos com a abertura de uma porta onde o sonho de justiça ache passagem.


(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)  

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