O mês de Outubro passou do meio. A temperatura se eleva,
intercalada por alguns momentos de frio. As tardes não são mais de sol
permanente, nem as manhãs. Nuvens cobrem o firmamento, em tonalidades variadas,
que vão do cinza ao escuro, aquelas que fazem os poetas dizerem que o céu está
carrancudo. A meteorologia marca
previsões de chuvas isoladas quase diariamente.
Todo mundo sabe que daqui para frente,
durante uns quatro meses, a temperatura sobe e a expectativa de chuvas é
normal. Pelo que a cidade viveu em 2006,
2008, 2010 e início de 2012, os traumas deixam os espíritos inquietos. Quando o ciclo anual se completa, as
apreensões de quem vive ou tem negócios às margens dos rios e nos altos de
morro causam um estado silencioso de pânico.
Se houver chuvas fortes durante alguns dias, ou precipitar alguma tromba
d’água nas serras de São Geraldo, ou da Piedade de Cima, já sabemos que o
Chopotó vai transbordar. Às margens do
Chopotó e do Piedade há muitas casas, quintais, lojas comerciais, oficinas e um
sem-número de atividades humanas em áreas de risco, incluindo a Avenida
Beira-Rio, construída dentro do espaço onde deveriam estar as matas
ciliares. A pista se encontra pouco
acima do nível por onde passam as águas em tempo de estiagem. Por isto a erosão
tem danificado muitos trechos da pista de rolamento, e a inundação afeta e
arrasta tudo o que encontra no seu caminho em direção ao mar.
Como não há remédio diante do mal feito
contra a Natureza, resta aos que se encontram nessas áreas vulneráveis o apelo
a São Gerônimo e Santa Bárbara, sempre invocados na iminência de tempestades e
trovões.
Nos tempos em que as casas de tijolos
ou pau-a-pique eram cobertas de telha, com engradamento de caibros, sarrafos e
bambus, durante as ventanias os moradores acendiam palha benta, velas e oravam
a esses santos para afastar os efeitos dos vendavais.
De agora até janeiro/fevereiro, é
provável que os comerciantes das imagens e orações desses santos tenham de
aumentar seus estoques. Os imóveis
deixaram de ter a simplicidade do sapé, das telhas curvas coloniais feitas nas
coxas dos escravos, desiguais por causa da desconformidade física daqueles rudes
artesãos. Predominam as lajes de cimento
armado e os engradamentos de ferro das coberturas sofisticadas. Mas a água mole mansamente corrói pela
ferrugem com o tempo. E, quando os rios transbordam, arrastam tudo o que
encontram pelo seu caminho arbitrariamente invadido.
Os rios Piedade e Chopotó reclamam que
invadiram seu espaço, destruíram suas proteções das impurezas que lhes causam
assoreamento, desprezaram a necessidade de aprofundar seu sulco de passagem,
que lhes pertence desde antes da existência da espécie humana. Quando a evaporação forma nuvens pesadas que
se chocam no ar e desabam as águas nas montanhas, o caminho para o escoamento
em direção ao mar são os velhos rios, que deveriam ser tratados com carinho e
respeito, porque seu papel natural é servir ao ambiente por onde banha, levando
os excrementos que o crescimento habitacional despeja.
Os rios lavam, limpam, às vezes
transportam. Mas teriam que ser tratados
com o devido respeito. Seu espaço é
sagrado. O Chopotó deu seu grito de
alerta em 1932. Mostrou do que era
capaz, apesar de normalmente manso e pequeno, mas bravo e forte se
provocado. Deu mais alguns avisos com espaço longo, como em 1959.
Entretanto, houve pessoas que se
consideraram proprietários da Natureza e de seus cursos d’água. Vieram as respostas em 2006, 2008, 2010 e em
janeiro de 2012.
O mal feito continua na sua
trajetória. Há vidas inocentes expostas
ao risco. Outras já se foram. A possibilidade de chuvas torrenciais e
transbordamento é fato previsível.
Quando o céu fizer cara feia com suas
nuvens negras e os ventos sacudirem as árvores, restará o antigo apelo aos
milagres de São Gerônimo e Santa Bárbara, com a alternativa das palhas bentas.
(Franklin Netto –
viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)
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