Poderíamos usar a expressão de Jacynto Batalha “Um
passeio no tempo”, no seu documentário histórico apresentado no Festival de
Cinema de Visconde do Rio Branco “Geraldo Santos Pereira” realizado no fim do
mês passado.
O filme tem
um viés romântico e nos desperta saudosismo, quando nos limitamos a observar
pessoas e fatos de um passado conduzido dentro dos limites da cidade que não
entrara na era do crescimento urbano. Ficou no tempo em que nos limites da Praça 28
de Setembro e seu entorno havia um conjunto arquitetônico harmonioso e que
serviu de base para filmagens com enredo de época.
Até aí,
os jovens, à medida que se encontravam
habilitados em alguma profissão e precisavam trabalhar, saíam do Município para
buscar melhores condições de vida nas cidades grandes, sobretudo São Paulo e
Rio de Janeiro.
Quem buscava tentar a sorte em São Paulo, eram
predominantemente oriundos da zona rural. Por causa dessa migração, durante
muito tempo o número de habitantes mantinha certa estabilidade. Quem ficava, vivia
do corte de cana e dos serviços mais humildes por falta de especialização.
Alguns poucos, que chegavam aos cursos médios, se empregavam em banco ou
escritórios diversos, e no comércio.
Usina Rio Branco - 1913 - Imagem: www.novomilenio.inf.br
Rua Teófilo Otôni. à Esquerda acervo da Usina São João. Imagem: Isah Baptista
A estrada de ferro, existente desde o tempo do
Império(1880), contribuiu até certo tempo para a população manter estreita
ligação com a cidade do Rio de Janeiro. Muitos foram procurar emprego,
constituíram família e passaram a entrar no rol dos rio-branqueses
ausentes. Isto durou até São Paulo puxar
a Revolução Industrial e implantar com predominância as fábricas de veículos,
que, por sua vez forçou o crescimento da metalurgia. Eram trabalhos pesados,
bem remunerados, e que não exigiam grau de escolaridade alta. Foi o que
provocou o êxodo rural em toda a região.
No começo da década de 1970, houve motivo para criação de linha de
ônibus direta daqui para a capital paulista. E no ABCD passaram a conviver
muitos de nossos conterrâneos de origem rural.
A migração
durou até os anos 90. A partir daí, os limites de espaço para os trabalhadores
de fora deram sinais de esgotamento. Na
verdade, atingia o inchaço populacional, com a alta densidade demográfica, e as suas consequências de desemprego e violência, à medida que as fábricas se
aprofundavam na informática e na robotização das funções operárias. Braços cruzados. Queda de oportunidades, que se espalhava
pelo Brasil inteiro.
A
alternativa passou a ser retornar às origens.
E quem saiu da roça e havia se acostumado nas cidades não sentia
atrativos para retornar à lavoura.
Muitos pegaram suas indenizações, venderam seus bens, e vieram de volta.
O crescimento urbano aconteceu. De 25.000 habitantes em 1970, chega aos 38.000 nos dias de hoje. Sem
planejamento, entretanto. Sem estudos
que considerassem topografia, equilíbrio ecológico, áreas de risco.
Imaginava-se
um crescimento habitacional no plano horizontal, às margens das rodovias e
estradas que ligam o Município aos municípios vizinhos e à zona rural, sem
risco de desmoronamento e das enchentes. Isto está no instinto de sobrevivência
racional. E a enchente de 1932 e outras
posteriores, como a do fim dos anos 50,
já deixavam aviso sobre os limites inconvenientes para construções. E teria que ser
levada em conta a preservação das áreas necessárias à absorção das chuvas no
perímetro urbano.
Nenhuma
dessas precauções foi observada. Os bairros e loteamentos surgiram morro acima,
morro abaixo, às margens dos rios
Chopotó e Piedade, formando galhos nos píncaros das ruas principais de origem
desde a Aldeia dos Coroados, Presídio e Paróquia de São João Batista. Vias básicas: Santo Antônio, Rua Nova, Água
Limpa, Rua dos Pedros, Chácara, Piedade,
Pito Aceso, Estrada da Colônia...
Se antes já
houvera as enchentes de advertência, agora que as áreas verdes foram
substituídas por asfalto e cimento armando, as chuvas caem e vão direto para as
partes baixas em direção ao leito do rio. Matas ciliares foram extintas transformados em
bairros. desde as margens do Chopotó e do Pidedade até os altos dos morros
As valas de
escoamento das águas fluviais tinham pouca capacidade de receber as águas
pluviais, sem transbordar.
A construção
de vias de trânsito e prédios à beira do rio criou imensas áreas de risco, que
vêm desde o Bairro da Piedade, por um lado, desde a proximidade da Igreja Santo Antônio, por outro, passam pela confluência(encontro) dos dois, segue cidade abaixo, até terminar o
perímetro urbano a caminho de Guidoval.
Quando
tomamos certos pontos de observação, vemos muitas construções que se tornaram
áreas de riso. Das proximidades da Ponte do Dr. Lelé, as obras dentro do rio
estão no Piedade acima, como parte do Bairro Veneza(este nome não é por acaso).
Na descida do Chopotó, em direção à Ponte do Carrapicho, de um lado e de outro
estão as construções ocupando o espaço por onde passariam as enchentes. O desmoronamento do prédio de 02 pavimentos,
com uma vítima fatal, em frente ao
“encontro” em novembro de 2010, revela o quadro de perigo para todo aquele
corredor que margeia esse rio.
Da Ponte do
Carrapicho, para cima e para baixo, a situação continua a mesma: obras
avançadas obstruem o fluxo das águas nas cheias. A partir dessa ponte, há, de
um lado, a Rua Dr. Altino Peluso, antiga e conhecida como Caminho da Vovó, ou
Rua da Feirinha. Do lado esquerdo começa a Av.
Beira-Rio, onde dois prédios já parecem pendurados, devido à erosão que
limitou à metade o uso da pista de rolamento.
E segue com muitos pontos onde a cada período de chuvas há
desmoronamento, que cobram reparos de arrimo, caros e cada vez mais a começar
no fundo do rio.
Na ponte da
Água Limpa, um prédio de um lado, e outro do outro, ocupam a metade do
rio. Tanto é que, de qualquer lado que
se olhe a Ponte, só se vê a metade dela.
O Rio segue
por um trecho intransitável até a estreita Ponte da Cooperativa, na Rua Diogo
Braga, próximo ao Posto de Saúde. Dali
até a Ponte Branca, na Av. Oscar Salermo(Barreiro), residências, lojas, oficinas e até um pequeno loteamento se
encontram em completa área de risco. O
fundo do rio está com pequena diferença de nível para a Avenida. Na última
enchente(02/01/2012), houve erosão de vários trechos da pista, que ficou algum
tempo interditada para obras de reparação. Imagens dessa enchente mostram as
construções atingidas até as janelas pelas águas.
Depois que
as águas baixaram, cada um fazendo a faxina dos entulhos e das águas barrentas,
a vida parece que volta ao normal. Mas o
tempo passa veloz. Daqui a dois meses
estamos em outubro. Se hoje a
meteorologia anunciou “Tempo nublado com chuvisco”, daqui a pouco estaremos em
plena Primavera que, para nós, tem ares
de começo de Verão. Nuvens escuras aparecem e trazem precipitações
pluviométricas. Em 2010 a enchente
aconteceu em novembro. A última veio no
começo de janeiro. Tem havido uma
variação de meses de uma para outra. Observa-se que, à medida que cresce a
população urbana, diminui o tempo entre uma enchente e outra. A eliminação das
áreas verdes, contribui para o crescimento das águas dentro do Rio.
Para existir
a Avenida dentro da cidade, era imprescindível analisar a capacidade cúbica do
vale por onde passam as enchentes. A
Natureza ensina. As cheias a partir de
1932 alertavam. Ou se teria que afundar
e alargar o Rio para pelo menos o dobro de sua capacidade, ou não se poderia
ter construído vias de trânsito às suas margens. Muito menos concederem-se
alvarás de construção nessas áreas. Duas vítimas fatais e prejuízos aconteceram
nas duas últimas enchentes. Estamos
diante de tragédias anunciadas a cada novo Verão. A sociedade, junto com os
mandatários dos três poderes, tem que estudar e tomar medidas preventivas para
que o problema não se multiplique. Não estamos fazendo alarme. Estamos
analisando fatos.
(Franklin
Netto – conscienciadamata@gmail.com)
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