quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

A destruição de prédios históricos na cidade significa ação totalitária


                  

         Dona Theresinha de Almeida Pinto renunciou à presidência do Conselho Consultivo do Patrimônio Histórico de Visconde do Rio Branco, por não ter conseguido preservar da demolição pelo menos uma porta de prédio que fora talvez a primeira e mais importante casa comercial do Município.  No mesmo quarteirão, outras unidades de igual valor haviam sido substituídas por caixotões de cimento armado sem estética e sem harmonia arquitetônica.

         O conjunto desses prédios no centro da cidade era mais do que um sítio de obras de arte. Continha o estilo neoclássico, que mantinha em suas formas as mensagens da razão e da liberdade do iluminismo, inspirador da Declaração de Independência dos Estados Unidos, A Carta dos Direitos dos Estados Unidos, a Declaração Francesa dos Direitos de Homem e do Cidadão e, por extensão e sua influência, os ideais da Inconfidência Mineira, até chegar à Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana pela ONU.
 
         Os artistas que moldaram esses prédios impregnaram a filosofia da liberdade, da justiça e da igualdade, acolhida por Tiradentes, Tomaz Antônio Gonzaga e demais inconfidentes influenciados por Voltaire, Montesquié, David Hume, John Locke, Thomaz Jefferson, Jean Jacques Rousseau e tantos intelectuais e filósofos do passado. E essa influência chegou, mais tarde, no Brasil, até as ações humanitárias do político Getúlio Vargas.
  
         E Visconde do Rio Branco, que já tem no nome a lembrança do autor da Lei do Ventre Livre, mantinha na sua arquitetura a cultura da liberdade e da justiça. O simbolismo das fachadas desses prédios contém significado muito acima do conceito pouco nobre de algo obsoleto, que deve ser desmanchado porque esteja velho.  A harmonia de um conjunto conta a história de uma civilização, e tem importância maior do que o direito absoluto de propriedade que deve coexistir com o contexto social e a imagem de um povo culto. 

         A especulação imobiliária, quando desrespeita o princípio histórico e filosófico marcado pelos artistas e pensadores de um estilo, torna-se agressiva e arbitrária diante da beleza e da paisagem, alterada por esses tumores, que vão surgindo como corpos estranhos no seu organismo.

         Visconde do Rio Branco era realmente uma cidade neoclássica, alterada no seu estilo original, por falta de critério dos proprietários e, acima de tudo, dos dirigentes que teriam de estabelecer normas sobre construções e edificações, de maneira a preservar a sua identidade histórica.

         O mal da mistura de gestão da coisa pública com os interesses particulares causa essas distorções na vida e na cultura de uma cidade.

         Algumas instituições públicas alteraram nosso cenário que fazia da Praça 28 de Setembro uma das mais belas do Estado de Minas, centralizada pelo Jardim, batizado de Parque Municipal Peixoto Filho, na sua inauguração em 17 de outubro de 1909, conforme crônica do Professor Sylvio Passos.

          Imagem da inauguração dá a entender que nenhuma de suas belas palmeiras de outrora e suas demais árvores ainda existentes seja centenária. Estamos a sete anos do centenário.

         Pelos conceitos de preservação de hoje, o prédio do primeiro terminal rodoviário do Município construído nos anos 50 do Século passado teria sido uma das primeiras violações daquele Parque. Mais tarde, nos anos 70, o atual Coreto, no lugar do original, que tinha as características neoclássicas, também feriu a harmonia arquitetônica do Jardim e da Praça.  A construção do prédio da agência do Banco do Brasil no meio daquele alinhamento de prédios históricos,  quebrou a estética da carreira lateral onde se encontra o Cine Brasil.  E a Agência da Caixa Econômica Federal feriu a visibilidade do jardim estilo francês à frente da mansão da família Carone, onde funciona atualmente o Conservatório Estadual de Música.  Apesar de a construção dessa agência ter sido condicionada a uma altura que não prejudique a visibilidade do Conservatório, a beleza  do corredor do portão à escadaria da mansão ficou ofuscada.
        
         Agora, o entorno do conjunto formado no adro da Matriz, pelos prédios da Prefeitura, da Igreja e da Sociedade Musical 13 de Maio, está sendo prejudicado na amplitude de sua visibilidade por prédios erguidos sem limite de altura, o que ofusca a projeção da torre da igreja e seus prédios laterais.
        
         Recentemente, no início deste ano, foram demolidos três prédios inventariados na Rua Floriano Peixoto, que faziam parte do sítio arquitetônico construído pelo Dr. Jorge Carone(pai) juntamente com a mansão(Conservatório).  Essa demolição sofreu impedimento judicial e se encontra paralisada desde o começo do ano.

         Essas excrescências alteraram o perfil do centro da cidade, notadamente a Praça 28 de Setembro.
   
         Outros atentados à imagem do município vêm sendo cometidos: houve tentativa de acabar com o Estádio da Boa Vista Joseph Lambert (o campo do Nacional A.C.), para transformá-lo em um condomínio fechado. Só não aconteceu porque aquele bem imóvel já era tombado pelo Patrimônio Público Municipal.  A mesma sorte não teve o Estádio do Bouchardet, na Ladeira José Soares da Costa(Morro da Forca).  O povo do Barreiro e moradores daqueles arredores reclamam da sua demolição, além dos amantes do futebol de vários pontos da cidade. Aquele Estádio fora palco de grandes competições em jogos amistosos e em disputas oficiais de campeonatos, marcadamente no tempo de grande rivalidade entre o Nacional A.C. e o E.C. Mário Bouchardet, que movimentavam muitas tardes de domingo e discussões apaixonadas nas rodas de torcedores.

         Quando as usinas de açúcar funcionavam, havia vários clubes da zona rural, formados em volta das suas fazendas, e que disputavam campeonatos “domésticos”, isto é, de pessoal pertencente aos quadros dos cortadores de cana.

         Por falta de uma disciplina oficial sobre obras e edificações, o Município vem sofrendo amputações no corpo de sua imagem e de sua história.

         Por questão de bom senso, as construções de edifícios e investimentos em atividades comerciais de maior porte deveriam  acontecer ao longo das ruas e avenidas que conduzem do centro para as cidades vizinhas e para a zona rural. E também em todos os bairros existentes no perímetro urbano.  A área no raio de um quilômetro em torno da Praça 28 de Setembro se encontra saturada.  Agora é questão de estrutura. O piso não suporta maior movimento de veículos pesados. A largura das ruas é insuficiente para grande trafegabilidade. Ninguém sabe até quanto suporta a consistência do solo para prédios altos.

 
         Estávamos no meio das pesquisas para esta matéria, quando recebemos a notícia da morte do arquiteto do Século XX Oscar Niemeyer.  É o gênio da arquitetura que o mundo inteiro admira e respeita.  Daqui a algum tempo suas obras pertencerão ao passado.  Produziu para o Brasil e para o mundo.  Eu duvido que o mundo civilizado venha a tratar no futuro as obras de Oscar Niemeyer, da maneira como nossos construtores de hoje estão tratando as obras dos gênios do passado em Visconde do Rio Branco.         

(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)

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