Dona Theresinha de Almeida Pinto
renunciou à presidência do Conselho Consultivo do Patrimônio Histórico de
Visconde do Rio Branco, por não ter conseguido preservar da demolição pelo
menos uma porta de prédio que fora talvez a primeira e mais importante casa
comercial do Município. No mesmo
quarteirão, outras unidades de igual valor haviam sido substituídas por
caixotões de cimento armado sem estética e sem harmonia arquitetônica.
O conjunto desses prédios no centro da
cidade era mais do que um sítio de obras de arte. Continha o estilo
neoclássico, que mantinha em suas formas as mensagens da razão e da liberdade
do iluminismo, inspirador da Declaração de Independência dos Estados Unidos, A
Carta dos Direitos dos Estados Unidos, a Declaração Francesa dos Direitos de
Homem e do Cidadão e, por extensão e sua influência, os ideais da Inconfidência
Mineira, até chegar à Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana pela ONU.
Os artistas que moldaram esses prédios
impregnaram a filosofia da liberdade, da justiça e da igualdade, acolhida por
Tiradentes, Tomaz Antônio Gonzaga e demais inconfidentes influenciados por
Voltaire, Montesquié, David Hume, John Locke, Thomaz Jefferson, Jean Jacques
Rousseau e tantos intelectuais e filósofos do passado. E essa influência chegou, mais tarde, no Brasil, até as ações humanitárias do político Getúlio Vargas.
E Visconde do Rio Branco, que já tem no
nome a lembrança do autor da Lei do Ventre Livre, mantinha na sua arquitetura a
cultura da liberdade e da justiça. O simbolismo das fachadas desses prédios
contém significado muito acima do conceito pouco nobre de algo obsoleto, que
deve ser desmanchado porque esteja velho.
A harmonia de um conjunto conta a história de uma civilização, e tem importância
maior do que o direito absoluto de propriedade que deve coexistir com o
contexto social e a imagem de um povo culto.
A especulação imobiliária, quando
desrespeita o princípio histórico e filosófico marcado pelos artistas e
pensadores de um estilo, torna-se agressiva e arbitrária diante da beleza e da
paisagem, alterada por esses tumores, que vão surgindo como corpos estranhos no
seu organismo.
Visconde do Rio Branco era realmente
uma cidade neoclássica, alterada no seu estilo original, por falta de critério
dos proprietários e, acima de tudo, dos dirigentes que teriam de estabelecer normas
sobre construções e edificações, de maneira a preservar a sua identidade
histórica.
O mal da mistura de gestão da coisa
pública com os interesses particulares causa essas distorções na vida e na
cultura de uma cidade.
Algumas instituições públicas alteraram
nosso cenário que fazia da Praça 28 de Setembro uma das mais belas do Estado de
Minas, centralizada pelo Jardim, batizado de Parque Municipal Peixoto Filho, na
sua inauguração em 17 de outubro de 1909, conforme crônica do Professor Sylvio
Passos.
Imagem
da inauguração dá a entender que nenhuma de suas belas palmeiras de outrora e
suas demais árvores ainda existentes seja centenária. Estamos a sete anos do
centenário.
Pelos conceitos de preservação de hoje,
o prédio do primeiro terminal rodoviário do Município construído nos anos 50 do
Século passado teria sido uma das primeiras violações daquele Parque. Mais
tarde, nos anos 70, o atual Coreto, no lugar do original, que tinha as
características neoclássicas, também feriu a harmonia arquitetônica do Jardim e
da Praça. A construção do prédio da
agência do Banco do Brasil no meio daquele alinhamento de prédios históricos, quebrou a estética da carreira lateral onde se
encontra o Cine Brasil. E a Agência da
Caixa Econômica Federal feriu a visibilidade do jardim estilo francês à frente
da mansão da família Carone, onde funciona atualmente o Conservatório Estadual
de Música. Apesar de a construção dessa
agência ter sido condicionada a uma altura que não prejudique a visibilidade do
Conservatório, a beleza do corredor do
portão à escadaria da mansão ficou ofuscada.
Agora, o entorno do conjunto formado no
adro da Matriz, pelos prédios da Prefeitura, da Igreja e da Sociedade Musical
13 de Maio, está sendo prejudicado na amplitude de sua visibilidade por prédios
erguidos sem limite de altura, o que ofusca a projeção da torre da igreja e
seus prédios laterais.
Recentemente, no início deste ano,
foram demolidos três prédios inventariados na Rua Floriano Peixoto, que faziam
parte do sítio arquitetônico construído pelo Dr. Jorge Carone(pai) juntamente
com a mansão(Conservatório). Essa
demolição sofreu impedimento judicial e se encontra paralisada desde o começo
do ano.
Essas excrescências alteraram o perfil
do centro da cidade, notadamente a Praça 28 de Setembro.
Outros atentados à imagem do município vêm
sendo cometidos: houve tentativa de acabar com o Estádio da Boa Vista Joseph
Lambert (o campo do Nacional A.C.), para transformá-lo em um condomínio
fechado. Só não aconteceu porque aquele bem imóvel já era tombado pelo
Patrimônio Público Municipal. A mesma
sorte não teve o Estádio do Bouchardet, na Ladeira José Soares da Costa(Morro
da Forca). O povo do Barreiro e
moradores daqueles arredores reclamam da sua demolição, além dos amantes do
futebol de vários pontos da cidade. Aquele Estádio fora palco de grandes
competições em jogos amistosos e em disputas oficiais de campeonatos,
marcadamente no tempo de grande rivalidade entre o Nacional A.C. e o E.C. Mário
Bouchardet, que movimentavam muitas tardes de domingo e discussões apaixonadas
nas rodas de torcedores.
Quando as usinas de açúcar funcionavam,
havia vários clubes da zona rural, formados em volta das suas fazendas, e que
disputavam campeonatos “domésticos”, isto é, de pessoal pertencente aos quadros
dos cortadores de cana.
Por falta de uma disciplina oficial
sobre obras e edificações, o Município vem sofrendo amputações no corpo de sua
imagem e de sua história.
Por questão de bom senso, as
construções de edifícios e investimentos em atividades comerciais de maior
porte deveriam acontecer ao longo das
ruas e avenidas que conduzem do centro para as cidades vizinhas e para a zona
rural. E também em todos os bairros existentes no perímetro urbano. A área no raio de um quilômetro em torno da
Praça 28 de Setembro se encontra saturada. Agora é questão de estrutura. O piso não
suporta maior movimento de veículos pesados. A largura das ruas é insuficiente
para grande trafegabilidade. Ninguém sabe até quanto suporta a consistência do
solo para prédios altos.
Estávamos no meio das pesquisas para
esta matéria, quando recebemos a notícia da morte do arquiteto do Século XX
Oscar Niemeyer. É o gênio da arquitetura
que o mundo inteiro admira e respeita.
Daqui a algum tempo suas obras pertencerão ao passado. Produziu para o Brasil e para o mundo. Eu duvido que o mundo civilizado venha a
tratar no futuro as obras de Oscar Niemeyer, da maneira como nossos
construtores de hoje estão tratando as obras dos gênios do passado em Visconde
do Rio Branco.
(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)
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