(Compilado por Paulo Timm)
Adriano Benayon * – 29.10.2012
Desde há séculos o Brasil carece de governo autônomo, capaz de promover o
progresso econômico e social. A independência proclamada em 1822 não se
traduziu em autonomia real, pois o País atravessou o Império e os primeiros
anos da República sob tutela financeira e política da Inglaterra, até o
final da Primeira Guerra Mundial, e do império anglo-americano desde então.
2. Os lampejos de autonomia duraram pouco, logo apagados por intervenções da
oligarquia mundial. Assim, nos anos 1840 com a tarifa Alves Branco, uma
tentativa de viabilizar o surgimento de indústrias nacionais. Também, com os
empreendimentos abrangentes do Barão de Mauá, dos anos 1850 aos 1880, e com
iniciativas limitadas, como a fábrica de linhas de Delmiro Gouveia em
Alagoas, 1912-1917.
3. Os avanços na redução da dependência econômica foram contidos ou
anulados pela dependência política. E esta decorreu da subordinação da
economia agrária e exportadora de bens primários aos interesses comerciais e
industriais de potências estrangeiras.
4. Quando Getúlio Vargas, promoveu maior grau de autonomia nacional - de
1934 a 1945 e de 1951 a 1953 - as potências hegemônicas - coadjuvadas
pelas “classes conservadoras” locais e pela mídia venal – montaram complôs
para desestabilizar e derrubar o governo.
5. Como Vargas antes, João Goulart, em 1962-1963, não se precaveu diante
das maquinações imperiais, tarefa difícil em regime “democrático” no qual o
poder financeiro determina o processo político.
6. Mesmo sendo escassa a proteção tarifária e a não-tarifária, e operassem
no Brasil vários carteis e grandes empresas estrangeiras, surgiram numerosas
indústrias de capital nacional substituidoras de importações na segunda
metade do Século XIX e na primeira do Século XX.
7. Cito quatro livros que o demonstram: Warren Dean, A Industrialização de
São Paulo (1880-1945); Edgard Carone, O Centro Industrial do Rio de Janeiro
e sua Importante Participação na Economia Nacional (1827-1977), ed. Cátedra,
Rio 1978; Delso Renault, 1850-1939 O Desenvolvimento da Indústria
Brasileira, SESI; Eli Diniz, Empresário, Estado e Capitalismo no Brasil
1930-1945, ed. Paz e Terra, SP 1978.
8. O próprio Vargas só restringiu investimentos estrangeiros em poucos
setores e demorou a notar o volume das remessas de lucros ao exterior, o que
está longe de ser único dos prejuízos que eles causam à economia.
9. As potências imperiais realizaram seus objetivos a partir de Café Filho,
fantoche dos entreguistas civis e militares (1954). JK, eleito em 1955,
pelos votos getulistas, ampliou os benefícios ao capital estrangeiro.
10. Daí não terminou mais a escalada de desnacionalização, não obstante se
terem criado estatais na área produtiva –privatizadas de forma vergonhosa a
partir de 1990 - tendo o Estado feito também investimentos nas
infra-estruturas econômica e social.
11. O poder público subsidiou as transnacionais, e esmagou empresas
nacionais.
12. Resultado: em 1971 o capital estrangeiro já controlava setores
importantes: mercado de capitais 40%; comércio externo 62%; serviços
públicos 28%; transportes marítimos 82%; transporte aéreo externo 77%;
seguros 26%; construção 40%; alimentos e bebidas 35%; fumo 93,7%; papel e
celulose 33%; farmacêutica 86%; química 48%; siderurgia 17%; máquinas 59%;
autopeças 62%; veículos a motor 100%; mineração 20%; alumínio 48%; vidro
90%.
13. Em 1971 o estoque de investimentos diretos estrangeiros (IDEs) não
chegava a US$ 3 bilhões. Em 2011 atingiu US$ 669,5 bilhões.
14. O montante de 2011 é 40 vezes maior que o de 1971 atualizado para
US$ 16, 6 bilhões. No período, o PIB, em dólares corrigidos, só se
multiplicou por 6.
15. Os IDEs referem-se só às empresas com maioria de capital estrangeiro,
não aos “investimentos estrangeiros em carteira” (participações no capital
de empresas e aplicações em títulos públicos e privados). Esses acumularam
US$ 597 bilhões até 2011. Os empréstimos, US$ 190 bilhões. A soma dá quase
US$ 1,5 trilhão.
16. É fácil emitir dólares do nada e com eles comprar ativos. Mais: grande
parte dos IDEs é reinvestimento de lucros, e quantia muitíssimo maior que
a dos ingressos foi remetida ao exterior a título de lucros, dividendos,
juros, afora os ganhos camuflados em outras contas do balanço de transações
correntes. Disso originou-se a dívida pública, fator de empobrecimento e de
dependência.
17. A desnacionalização prossegue galopante. Conforme a “Pesquisa de Fusões
e Aquisições” da consultoria KPMG, 247 empresas foram adquiridas por
transnacionais de janeiro a setembro de 2012. Em todo 2011 haviam sido 208.
De 2004 para cá foram 1.247.
18. Em 2012 destacam-se: tecnologia da informação (33); serviços para
empresas (20); empresas de internet (19); supermercados, açúcar e álcool
(35); publicidade e editoras (10); alimentos, bebidas e fumo (10); mineração
(9); óleo e gás (8); educação (7); shopping centers (7); imobiliário (7).
19. Ainda mais estarrecedora que a avassaladora ocupação da economia
brasileira é a persistência na mentalidade de que os investimentos
estrangeiros beneficiam a economia.
20. Não houve evolução, desde os anos 50 e 60, no entendimento da realidade.
Continuam sendo escamoteadas as causas do enorme atraso tecnológico do País
e disto tudo: pobreza, insegurança, infra-estrutura lastimável, desagregação
social, desaparelhamento da defesa e cessão de territórios a pretexto de
proteção ao ambiente e a indígenas.
21. O impasse da economia brasileira, prestes a desembocar em dificuldades
ainda maiores, sob o impacto da depressão nos países centrais, decorre das
percepções errôneas, subjacentes às recomendações da CEPAL (Comissão
Econômica para a América Latina da ONU) e à política “desenvolvimentista” de
JK.
22. Estas foram as falsas premissas, ainda não atiradas ao lixo, como
deveriam ter sido há muito tempo: 1) a industrialização como meta em si
mesma, independente da composição nacional ou estrangeira e do grau de
concentração do capital; 2) o capital estrangeiro tido por necessário para
suprir pretensa insuficiência local de recursos.
23. As políticas decorrentes dessas ideias redundaram na
desindustrialização e na descapitalização do País. Ignora-se a experiência
histórica – sempre confirmada - de nunca ter existido real desenvolvimento
em países nos quais predominem os investimentos estrangeiros.
24. Recorde-se que, de 1890 a 1917, ano da débâcle na guerra e da
revolução, o volume de investimentos estrangeiros na Rússia foi cerca de
três vezes superior ao do capital nacional.
* - Adriano Benayon é doutor em economia e autor do livro Globalização
versus Desenvolvimento, editora Escrituras, SP.
- "Carlos Ferreira" <ferreira.c@oi.com.br> Oct 31 08:52PM -0200
Nenhum comentário:
Postar um comentário