terça-feira, 6 de novembro de 2012

Visconde do Rio Branco tem perdido estética




         O conjunto arquitetônico da cidade tem sido prejudicado por falta de um código de obras e edificações que mantivesse a harmonia das novas construções com os prédios antigos, sem ferir a imagem histórica tão cara a um povo civilizado.

         As construções antigas compõem parte da imagem coletiva associada às novas, como a história que passa de geração em geração.  Para manter essa imagem, parte de uma tradição, as novas construções precisam  obedecer certos limites para não abalar o conjunto.

         E aqui faltou essa obediência e gerou verdadeiro conflito estético, no visual amplo abrangente aos prédios e à paisagem componente do centro da cidade, com a sua topografia de nivelamento variado.

         Estamos vendo os prédios históricos da prefeitura, da igreja matriz, da Sociedade Musical 13 de Maio(mais antigo do que a própria Matriz), assim como alguns outros ao longo do trecho onde se encontra o antigo Cine Brasil, sufocados na sua visibilidade por arranha-céus e outras construções menores, em completo desalinhamento e desnivelamento, como se vivêssemos um processo agressivo de verticalização que descaracteriza o espaço urbano já usado como cenário de filmes, quando tinha as características originais.

         O incentivo ao progresso dentro do bom senso limitaria a altura dos edifícios novos de maneira a manter harmonia entre a visão ampla do moderno entre os históricos.

         A falta dessa disciplina atende somente a interesses capitalistas ao colocar em pequena área de terreno uma quantidade maior de unidades residenciais, ou comerciais para o mercado. Isto também fere o esgotamento do espaço físico de toda a Praça 28 de Setembro e suas adjacências.

         O progresso de fato, bem planejado, estimularia a construção de espigões ao longo das avenidas, onde o seu alinhamento se dá de forma natural e em embeleza as suas laterais.  Ideais para esta forma de crescimento estão as avenidas São João Batista e Dr. Carlos Soares.  A Rua Santo Antônio também tem trechos adequados.  Ainda existem os Bairros de Lourdes e São Jorge e parte do Centenário com áreas niveladas.  Nesses lugares, o espaço para circulação de veículos favorece.  Ao contrário da Praça 28 de Setembro, Ruas Voluntários da Pátria e Floriano Peixoto que já atingiram seu limite de trafegabilidade.  Aumentar as atividades comerciais e residenciais nesses pontos fere todo princípio de previsibilidade.

         O improviso tem dominado nestas últimas décadas.  E vem trazendo danos à população e ao meio ambiente. Pouca ou nenhuma preocupação vem considerando o lado humano e social.

         Enquanto se construiu o Bairro Mutirão para tirar os pobres de dentro do Rio na Vila Azul, concederam-se as margens do Chopotó e Piedade para construções de alto padrão nas imediações da Estação Ferroviária.  As enchentes não fazem distinção de classe.

         O conjunto de ações destemperadas vem fazendo de Visconde do Rio Branco uma cidade feia, ao longo do curso do rio, que passa bem no centro da área urbana. E, quem gosta de passar algum tempo no jardim, o Parque Peixoto Filho, não vê mais em volta aquela imagem bonita em volta. Os espigões aparecem como corpos estranhos no meio das construções antigas que guardam em si muita história e recordação de pessoas, famílias inteiras que aqui se radicaram em épocas remotas e deixavam nas fachadas a própria imagem das gerações de hoje, mescladas aos traços dos antepassados.

         Chegamos a temer, diante da comercialização de certas religiões, que chegue um momento em que tentem comprar a própria Igreja Matriz, para construir um condomínio de luxo de frente para o jardim.   Mas aquele prédio, cheio de beleza e arte, está tombado pelo Patrimônio Histórico Municipal, como o Estádio da Boa Vista Joseph Lambert, que já foi objeto da cobiça imobiliária.

         A ameaça ao patrimônio paisagístico caminha a todo vapor.  A cara bonita da cidade ganha cicatrizes.  Não são rugas do envelhecimento saudável. São marcas das agressões desmedidas.

A mistura do moderno com o antigo está sendo predatória, como se netos extinguissem os avós, para evitar o trabalho de zelar por eles. Ignoram a sabedoria que os velhos possam compartilhar. Na verdade, pensam que sabem tudo além do tempo e da própria natureza. Por isto, vivem batendo com a cabeça na parede.  Tire-se do moderno a presença do antigo e nada fica. São os contrastes que realçam valores, de uns e de outros. Quem quer apagar o esplendor alheio, acaba na escuridão.

          A prepotência navega em águas turvas. Caminha pedantemente olhando só para o alto e escorrega pesadamente na lama sob os seus pés.

         Os contrastes desalinhados, que ferem a sensibilidade de quem aprecia o belo e cultua os valores de uma história bem vivida, acabam simbolizando caveiras das repugnantes aves de rapina, que, de tanto tentar desmantelar a vida de outros seres, terminam por extinguir a elas mesmas.  Tornam-se autofágicas, quando percebem que suas pretensas vítimas continuam vivendo livres e saudáveis, apesar de sua maldade, agressividade e egoísmo. Os outros se encontram vacinados contra esses predadores do bem comum.

         A cidade continua sua vida, mesmo vendo com tristeza o rio agredido, a paisagem manchada, os centros de lazer ameaçados, as pessoas humildes corrompidas.

         O Rio por si mesmo se regenera das agressões, faz tremer a margens que o agridem, e volta ao seu curso normal. Os olhos que querem ver a montanha na paisagem completa se levantam a um plano superior aos obstáculos.  E os centros de lazer mudam de lugar, como as próprias águas dos rios a contornar as pedras a caminho do mar.  E as marcas das aves de rapina viram esqueletos cadavéricos, que têm armaduras, mas não têm alma.  O poder econômico corrompe também o corruptor, que se consome com o próprio veneno.


         Assim vai a cidade, com suas formas desalinhadas, desniveladas, desarticuladas, mas viva, porque sua gente continua amando-a, confortando-a, mesmo com sua integridade material ofendida.  A imaterial continua intacta, porque esta é intocável.

         A cidade é de todos, é da sua história. Não pertence aos predadores.  Tem a sua própria natureza, o seu próprio caminho, a sua eternidade.  Os predadores são limitados pelo tempo, pela autofagia, pela insaciabilidade.

         Em 1970 o Município tinha pouco mais de 25.000 habitantes. Hoje tem mais de 38.000. Daqui a alguns anos ultrapassará os 50.000. É quando começa a se libertar dos grilhões que o aprisionam. Assim aconteceu e acontece com vários outros municípios.  As amarras das oligarquias vão se perdendo entre os dedos à medida que a população cresce.  A Internet alimenta mais cedo o sentimento de liberdade e independência de um povo, partindo do individual para o coletivo. A interação e o convívio em um círculo maior levam alguns a buscarem conhecimento além dos limites paroquiais, e compartilharem com os demais. E, mais cedo do que se pensa, cresce o ímpeto de libertação, da afirmação da auto-estima e da consciência de si mesmo.  E a cidade volta a preservar o que há de melhor, em sintonia com os avanços do progresso e da prosperidade coletiva.

(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)  

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