Compilação Literatura brasileira: os 10 maiores poemas de todos os tempos
Posted: 27 Nov 2012 04:48 AM PST
Lista foi organizada por grupo de escritores, críticos, professores e jornalistas e reuniu 24 poesias mais citadas entre 40 indicações totais. Confira as 10 mais votadasDois poemas de Manuel Bandeira (foto) integram lista. O ranking reuniu as 24 poesias mais citadas entre uma lista de 40 indicações. A Máquina do Mundo (Carlos Drummond de Andrade)
Abriu-se majestosa e circunspecta, sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável pelas pupilas gastas na inspeção contínua e dolorosa do deserto, e pela mente exausta de mentar toda uma realidade que transcende a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos.
Leia também
Vou-me Embora pra Pasárgada (Manuel Bandeira)
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolhereiVou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive
E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada
Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar
E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar —
Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.
Poema Sujo (Ferreira Gullar)turvo turvo a turva mão do sopro
contra o muro escuro menos menos
menos que escuro
menos que mole e duro
menos que fosso e muro:
menos que furo escuro
mais que escuro:
claro como água? como pluma?
claro mais que claro claro:
coisa alguma e tudo (ou quase)
um bicho que o universo fabrica
e vem sonhando desde as entranhas
azul era o gato azul
era o galo azul o cavalo azul
teu cu tua gengiva igual a tua bocetinha
que parecia sorrir entre as folhas de banana
entre os cheiros de flor e bosta de porco
aberta como uma boca do corpo
(não como a tua boca de palavras)
como uma entrada para eu não sabia
tu não sabias fazer girar a vida
com seu montão de estrelas
e oceano entrando-nos em ti bela
bela mais que bela mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era…
Perdeu-se na carne fria
perdeu na confusão de tanta noite e tanto dia
(Trecho de Poema Sujo, de Ferreira Gullar).
Soneto da Fidelidade (Vinícius de Moraes)De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.
Via Láctea (Olavo Bilac)“Ora (direis) ouvir estrelas!
Certo Perdeste o senso!”
E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto
A Via Láctea, como um pálio aberto, Cintila.
E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas?
Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
O Cão Sem Plumas (João Cabral de Melo Neto)A cidade é passada pelo rio como uma rua é passada por um cachorro; uma fruta por uma espada.O rio ora lembrava a língua mansa de um cão
ora o ventre triste de um cão,
ora o outro rio de aquoso pano
sujo dos olhos de um cão.
Aquele rio era como um cão sem plumas.
Nada sabia da chuva azul, da fonte cor-de-rosa,
da água do copo de água,
da água de cântaro, dos peixes de água, da brisa na água.
Sabia dos caranguejos de lodo e ferrugem.
Sabia da lama como de uma mucosa.
Devia saber dos povos.
Sabia seguramente da mulher febril que habita as ostras.
Aquele rio jamais se abre aos peixes,
ao brilho, à inquietação de faca que há nos peixes.
Jamais se abre em peixes.
Canção do Exílio (Gonçalves Dias)Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar — sozinho, à noite —
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu’inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
As Cismas do Destino (Augusto dos Anjos)Recife. Ponte Buarque de Macedo.
Eu, indo em direção à casa do Agra,
Assombrado com a minha sombra magra,
Pensava no Destino, e tinha medo!
Na austera abóbada alta o fósforo alvo
Das estrelas luzia…
O calçamento Sáxeo, de asfalto rijo, atro e vidrento,
Copiava a polidez de um crânio calvo.
Lembro-me bem. A ponte era comprida,
E a minha sombra enorme enchia a ponte,
Como uma pele de rinoceronte
Estendida por toda a minha vida!
A noite fecundava o ovo dos vícios
Animais. Do carvão da treva imensa
Caía um ar danado de doença
Sobre a cara geral dos edifícios!
Tal uma horda feroz de cães famintos,
Atravessando uma estação deserta,
Uivava dentro do eu, com a boca aberta,
A matilha espantada dos instintos!
Era como se, na alma da cidade,
Profundamente lúbrica e revolta,
Mostrando as carnes, uma besta solta
Soltasse o berro da animalidade.
E aprofundando o raciocínio obscuro,
Eu vi, então, à luz de áureos reflexos,
O trabalho genésico dos sexos,
Fazendo à noite os homens do Futuro.
(Trecho de As Cismas do Destino, de Augusto dos Anjos).
As Pombas (Raimundo Correia)Vai-se a primeira pomba despertada…
Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada.
E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada.
Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais;
No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles aos corações não voltam mais.
Invenção de Orfeu (Jorge de Lima)1. Um barão assinalado sem brasão,
sem gume e fama cumpre apenas o seu fado:
amar, louvar sua dama, dia e noite navegar,
que é de aquém e de além-mar
a ilha que busca e amor que ama.
Nobre apenas de memórias,
vai lembrando de seus dias,
dias que são as histórias, histórias
que são porfias de passados e futuros,
naufrágios e outros apuros,
descobertas e alegrias.
Alegrias descobertas ou mesmo achadas,
lá vão a todas as naus alertas de vaia mastreação,
mastros que apoiam caminhos a países de outros vinhos.
Está é a ébria embarcação.
Barão ébrio, mas barão, de manchas condecorado;
entre o mar, o céu e o chão fala sem ser escutado
a peixes, homens e aves, bocas e bicos, com chaves,
e ele sem chaves na mão.
2. A ilha ninguém achou porque todos o sabíamos.
Mesmo nos olhos havia uma clara geografia.
Mesmo nesse fim de mar qualquer ilha se encontrava,
mesmo sem mar e sem fim, mesmo sem terra e sem mim.
Mesmo sem naus e sem rumos,
mesmo sem vagas e areias,
há sempre um copo de mar
para um homem navegar.
Nem achada e nem não vista nem descrita
nem viagem, há aventuras de partidas
porém nunca acontecidas.
Chegados nunca chegamos eu e a ilha movediça.
Móvel terra, céu incerto,
mundo jamais descoberto.
Indícios de canibais,
sinais de céu e sargaços,
aqui um mundo escondido
geme num búzio perdido.
Rosa-de-ventos na testa,
maré rasa, aljofre, pérolas,
domingos de pascoelas.
E esse veleiro sem velas!
Afinal: ilha de praias.
Quereis outros achamentos
além dessas ventanias tão tristes, tão alegrias?
(Trecho de Invenção de Orfeu, de Jorge de Lima).
Fonte: Universia Brasil |
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
COLUNA DO PAULO TIMM(De Portugal) - Literatura brasileira: os 10 maiores poemas de todos os tempos
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