A consciência nacional sadia sente a
urgência de uma Reforma Política diante das evidências até aqui perceptíveis,
mas antes não oficializadas no grau e na abrangência revelada pela mais alta
Corte do País, o Supremo Tribunal Federal.
Antes parecia que episódios como os que
resultaram na cassação do mandato do ex-presidente Fernando Collor de Melo eram
situações isoladas, nos limites de um governante e seus aliados de campanha e
de governo.
Um fato curioso, na época: em São Paulo houve a marcha dos “Caras
Pintadas” com grande repercussão na mídia, principalmente porque eram jovens e
passavam a impressão de que uma mentalidade nova estaria brotando, como
expressão de indignação, depois de tanto tempo de apatia causada pela Ditadura
Militar. E, no mesmo ano, Paulo Maluf foi
eleito prefeito de São Paulo, com a mesma imagem de sempre. Era uma ducha fria nos ânimos por
pouco tempo otimistas.
Hoje, a dimensão do quadro negativo é maior, porque envolve
mais do que uma corrente política: é todo um arco de segmentos neste número
exagerado de 30 siglas partidárias que vai de um pólo ao outro, resumido no PT
e no PSDB, com os aliados que são comuns, dentro das vantagens fisiológicas que
cada um recebe. O partido de FHC, Serra
& Cia. batizou o Mensalão pelas bandas de Minas em 1998, pelas graças do “sacerdote”
Eduardo Azeredo, que teve como sacristão Marcos Valério com toda a
desenvoltura competente. O “menino”
cresceu, ganhou a simpatia dos espertalhões e teve entrada franca com tapete
vermelho nos mais requintados salões e palácios desta antiga República, que já
foi Velha, mudou denominações e só não abriu mão dos vícios de origem. E o sacristão deixou a humildade do coroinha
para crescer na vida com a atividade de bom empresário a intermediar as mais
vultosas transações que o mercado dos negócios ilícitos oportuniza.
Na tentativa de não cometermos injustiça, ressalvamos o PSOL,
que largou o barco petista, quando a embarcação começou revelar avarias na sua
conduta, que poderiam dar água. Na
verdade, o grupo que fundou este partido foi expulso das hostes lulistas por
discordar das posturas petistas de navegar em águas turvas.
O Mensalão ganhou as dimensões de ações próprias de máfia,
porque transcendeu os deslizes simplesmente políticos e de vantagens
ilícitas. O assassinato de Celso Daniel,
ex-prefeito de Santo André-SP, cravou a marca de que os integrantes dessa
corporação impuseram a prática de aplicar qualquer meio para atingir seus
objetivos. Parece que Al Capone e
Nicolau Maquiavel estiveram unidos como instrutores dessa corporação até na
forma de aliciar aliados.
O uso de oportunidades e brechas na Lei para adquirir
vantagens do poder parece vir desde a chegada de Cabral ao Brasil. Não vieram aqui com missão humanitária.
Vieram para saquear riquezas e escravizar os nativos nas suas explorações.
Fizeram uma reforma agrária ao contrário, tomando a terra de todos para doar a
uns poucos. Trouxeram os africanos acorrentados em navios para o
cativeiro. Nesse clima, desenvolveu-se a
colonização.
Na exploração dos mais fracos e menos instruídos estava
fomentada a política dos latifundiários que se tornaram os “coronéis”
eternizados no tempo e que duram até hoje, como vemos, com indumentária
diferente. Hoje, nos municípios, como
ontem nas paróquias, praticamente 1% da população domina e manipula os demais,
na usurpação da valorização do trabalho coletivo e na negação de oportunidade a
todos para se educarem e crescer.
A corrupção revelada no Mensalão é uma endemia de classes,
porque os corruptores criam situação de carência e dependência para tornar
corrupto quem esteja vulnerável à necessidade imediata, sem condições
psicológicas de avaliar as consequências de suas atitudes.
Esse um por cento tem presença vertical na organização
republicana: vai desde a capital federal até os menores municípios e
povoados. Em todo agrupamento humano, 1
manda e 99 obedecem.
Dessa hierarquia maquiavélica resultam a concentração de
renda e de poder; a submissão de todos a uns poucos; as injustiças; a baixa escolaridade; o analfabetismo; e a falta de uma vida digna e necessária como
exige a condição humana.
O Supremo consegue pegar “alguns tubarões” de colarinho
branco, contra quem conseguiu reunir provas suficientes por suas
falcatruas. Mas há um sem-número que
escapa, embora notoriamente beneficiários do Mensalão, por falta de provas. Não haveria celas especiais para tantos
culpados com dedos cheios de anéis, de cima em baixo.
Por tudo isto, vivemos mais um momento em que parece haver um
despertar de consciência nacional por urgente Reforma Política. Nada a esperar da classe atualmente nos poderes legislativos de todas as
instâncias. Esses corpos se encontram
infectados pelo vírus da corrupção. O
uso do cachimbo deixou muita boca torta.
O clamor é por uma Assembleia Nacional Constituinte Exclusiva. E que seja formada por quem esteja fora do
poder, de conduta ilibada, e que se disponha a não se candidatar por um tempo
razoável, para não ser tentado em legislar em causa própria. Na verdade, a proibição de legislar em causa
própria tem que ser cláusula pétrea. Há
que se esperar dos membros dessa Assembléia uma verdadeira doação de
patriotismo e desprendimento, para
evitar que, mais uma vez, os segmentos bem intencionados da população sejam frustrados.
Vemos, felizmente, de novo, sinais fortes de indignação na
juventude a defender ações de protesto sem violência. A luta armada está fora de moda. E há certeza de que os opressores estão muito
bem armados, bem protegidos, cheios de advogados que fazem tudo por dinheiro.
O Supremo está aplicando a justiça dentro do possível, no
ritual legal, democrático, com todo direito de defesa aos acusados. Assim há de caminhar a nação.
Caberá ao povo, à medida que tomar consciência dos crimes de
que é vítima, repudiar os opressores pelos caminhos da força do direito, mesmo
enfrentando o ilegítimo direito da força.
A Reforma Política terá que se basear em propostas populares,
elaboradas pelas classes sociais através de suas associações e órgãos voltados
para a justiça social, para ações humanitárias e que tenham consciência de que
vivemos um quadro alarmante de concentração de renda e de riqueza, e de
violenta desvalorização do trabalho, quando quem produz recebe somente um
quarto de suas necessidades básicas, em um país rico, cuja renda por habitante
permite oferecer à sua população os meios para uma vida confortável, segura,
com garantia de habitação, alimentação, vestuário, higiene, educação, lazer e
condições de prosperar.
(Franklin
Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)
Nenhum comentário:
Postar um comentário