sexta-feira, 29 de março de 2013

Sacrifício de Cristo lembra os torturados pela Ditadura


      


Esta Sexta-feira da Paixão acontece na antevéspera dos 48 anos da eclosão da Ditadura Militar que levou o Brasil aos 21 anos de obscurantismo sócio-político daquele tenebroso 31 de março de 1964. Era o ponto final de um período que o país ensaiava sua independência de fato, iniciado em 1930.  Interrompeu-se a evolução da classe trabalhadora que vinha adquirindo direitos de equilíbrio na relação capital/trabalho.  A soberania nacional dobrava os joelhos no calvário sob os açoites dos soldados das forças armadas brasileiras a serviço do governo dos Estados Unidos, que mantinha esquadras ancoradas nas costas marítimas do país para penetrar no território se houvesse resistência popular ao Golpe.

A conspiração teve a partida simbólica a partir, infelizmente, de Minas Gerais, da 4ª Região Militar de Juiz de Fora. Mas o cerco estava fechado.  Os tanques desfilaram como confirmação de ato consumado, na Avenida Rio Branco, Cinelândia, Rio de Janeiro, ponto mais simbólico da movimentação característica da expressão de nacionalismo e do que se entendia como esquerda do Brasil.  A capital fluminense era considerada capital política do país.  (consummatum est).
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Os últimos dias daquele março foram de muita tensão, de expectativa, de versões desencontradas, informação e contra-informação, clima de guerrilha urbana.  No dia 13, houve o famoso comício da Central do Brasil, com mais de 150 mil pessoas, onde Jango assinou decreto de criação da SUPRA – Superintendência da Reforma Agrária, a ser comandada por João Pinheiro Neto. E assinou mensagem que mandaria ao Congresso Nacional  propondo as Reformas de Base que incluíam, entre outras medidas, a limitação de lucros dos grupos estrangeiros para o exterior.

 
 historicaespetacular.blogspot.com

Aquele era o clima, eram os ingredientes, mas não foi a razão do Golpe, que vinha sendo tramado desde 1954, quando deixou de acontecer devido à morte de Getúlio Vargas.  E até o fim do mês concluiu-se o processo de conspiração.

Daí em diante, a história conta o resto. Mas a população pouco fica sabendo dos fatos e de suas razões porque o sistema de informação e da educação omite.  Tanta gente torturada, morta, desaparecida, porque se opunha ao Regime Ditatorial, ou porque, antes, defendia posições que levassem à soberania e à justiça social, foi a marca daqueles 21 anos de terror e censura.

No país tantos outros  foram sacrificados em outros tempos por defenderem os mesmos princípios, tendo sido Tiradentes o mais simbólico. No plano internacional tivemos Bolívar, Gandhi, Che Guevara.  Todos tomaram posições contra governos e sistemas opressores do ponto de vista social, político, econômico e militar.  Lutaram por libertação, transformações, reformas. Alguns somente no campo das idéias; outros incluíam a luta armada.  Todos, na essência, revolucionários. Visavam libertar povos e países da opressão e das injustiças.  No tempo da Guerra Fria, quem tinha essas posições era taxado de comunista, agitador, subversivo pelos que ficavam no campo oposto:> os reacionários, conservadores, retrógrados...

Se considerarmos o Cristo fora campo místico, procurando vê-lo um ser social, um homem político no seu tempo – era também um revolucionário, porque sua pregação se chocava com os poderosos, contra os governantes, os opressores de seu povo. E o poder de sua palavra diante da multidão provocava-lhe estigmas de feiticeiro, visionário, agitador – semelhantes às atribuições de utopia para quem sonha ou luta, em nossos dias, pela a justiça social.

Como Cristo, houve papas que defenderam relações mais humanas entre os donos do capital e os produtores dos bens de consumo – trabalhadores.  E que a imprensa conservadora (principalmente O Globo, no Brasil) taxava de papas comunistas: João XXIII e Paulo VI, que publicaram naqueles anos agitados de 50/60, as encíclicas:  Pacem in Terris, Mater et Magistra e Populorum Progressio, com inspiração na Rerum Novarum, de Leão XIII.

Com o fim da Ditadura, seus efeitos continuam. Os governantes posteriores ao ciclo dos militares, condicionados a “desde que a esquerda não chegue ao poder”, subscritores do Consenso de Washington, prosseguiram com as políticas sócio-econômicas de submissão aos organismos financeiros internacionais(FIM, BANCO MUNDIAL) e Estados Unidos. Mantêm o arrocho salarial, o desemprego estratégico para forçar a baixa do valor da mão de obra, o aumento da concentração de renda, a liberdade da especulação financeira, a perda gradativa dos direitos trabalhistas, a queda do valor real das aposentadorias e pensões.

Curioso é que alguns desses governantes e pretensos estiveram no palanque de Jango na Central do Brasil, como José Serra e Fernando Henrique Cardoso.  Serra era presidente da UNE, na ocasião(!).  FHC pertencera ao Partido Comunista Brasileiro.  Como outros, tiveram que se converter ao neoliberalismo para terem respaldo das instituições e governos internacionais como passaporte a candidatos da governança nacional. 

As encíclicas papais defendiam princípios comuns aos nossos esquerdistas:  
·         - que o trabalho não deve ser considerado mercadoria, mas expressão direta da pessoa humana e, por isso, não deve a sua remuneração ser deixada às leis do livre-mercado mas segundo a justiça e equidade;(Rerum Novarum) – Leão XIII.

  • - No campo social, ele cita a difusão dos seguros sociais e da previdência social; a maior responsabilidade dos sindicatos perante os problemas econômicos e sociais; o grande desnível entre zonas economicamente desenvolvidas e outras menos desenvolvidas dentro de cada país e ainda grande desnível entre os países desenvolvidos de então e os em vias de desenvolvimento; o aparecimento de "um bem-estar cada vez mais generalizado; a crescente mobilidade social e a consequente remoção das barreiras entre as classes; e o interesse do homem de cultura média pelos acontecimentos diários de repercussão mundial"(Mater et Magistra) – João XXIII.

·         - A encíclica é dedicada à cooperação entre os povos e ao problema dos países em desenvolvimento. O texto denuncia o agravamento do desequilíbrio entre países ricos, critica o neocolonialismo e afirma o direito de todos os povos ao bem-estar. A encíclica propõe a criação de um grande Fundo mundial, sustentado por uma parte da verba das despesas militares, para vir em auxílio dos mais deserdados. Pacem in Terris)  – Paulo VI.

Os papas posteriores voltaram às posições conservadoras da Igreja. Alguns considerados por uns historiadores como colaboradores de governos e sistemas de opressão, conforme a tradição.

    A partir do dia 1º de abril, segunda-feira, os documentos da Ditadura começarão a ficar disponíveis na Internet, conforme noticia hoje a Agência Brasil. Ninguém sabe, nesse jogo de concessões e acordos que se fazem nos bastidores, entre membros do governo, da Anistia Internacional, da Comissão da Verdade e das Forças Armadas, até que ponto os documentos foram disponibilizados.

    Ao contrário dos outros países, onde torturadores e governantes dos regimes de terror tiveram julgamento pelos crimes cometidos, no Brasil tudo se desenrola em banho-maria. Pode ser que os documentos abertos ao público contenham meias verdades. E, tanto parentes de vítimas e desaparecidos, quanto a sociedade em geral, poderão saber algo, nem tudo do que aconteceu nos porões da Ditadura.

    Apesar das encíclicas, de Cristo, dos mártires e heróis de cada tempo, como seres políticos, os tempos mudam de feição, mas as estruturas sociais de injustiças mantêm as mesmas proporções, na projeção global, como nos limites das divisas e fronteiras.

    Mesmo assim, mesmo que continue a ser utopia, lutar é preciso.  Ainda que o horizonte se afaste, a caminhada é indispensável.

    Cristo durou 33 anos. A soberania do Brasil, 34.

Fontes:
Rerum Novarum – Leão XIII
·         que o trabalho não deve ser considerado mercadoria, mas expressão direta da pessoa humana e, por isso, não deve a sua remuneração ser deixada às leis do livre-mercado mas segundo a justiça e eqüidade;
·         propriedade privada, mesmo dos bens produtivos, é um direito natural que o Estado não pode suprimir, comporta uma função social; mas é igualmente um direito que se exerce em proveito próprio e para o bem dos outros.”;
·         a razão de ser do Estado é a realização do bem comum e dentre outras obrigações tem a de zelar para haja uma produção suficiente de bens materiais, que as relações de trabalho sejam reguladas segundo a justiça e eqüidade e que nos ambientes de trabalho não sejam lesados a dignidade da pessoa humana, nem no corpo e nem na alma;
·         liberdade de organização e associação dos trabalhadores;

Mater et Magistra
·         No campo social, ele cita a difusão dos seguros sociais e da previdência social; a maior responsabilidade dos sindicatos perante os problemas econômicos e sociais; o grande desnível entre zonas economicamente desenvolvidas e outras menos desenvolvidas dentro de cada país e ainda grande desnível entre os países desenvolvidos de então e os em vias de desenvolvimento; o aparecimento de "um bem-estar cada vez mais generalizado; a crescente mobilidade social e a conseqüente remoção das barreiras entre as classes; e o interesse do homem de cultura média pelos acontecimentos diários de repercussão mundial".
·         No campo político, ele cita a independência política dos povos da África e da Ásia; o declínio dos regimes coloniais; "a participação na vida pública de um número cada vez maior de cidadãos de diversas condições sociais; a difusão e a penetração da atividade dos poderes públicos no campo econômico e social; [...] a multiplicação e a complexidade das relações entre os povos e o aumento da sua interdependência; e a criação e o desenvolvimento de uma rede cada vez mais apertada de organismos de projeção mundial, com tendência a inspirar-se em critérios supranacionais", sendo a ONU o seu exemplo mais paradigmático.
E foi neste conturbado contexto histórico, repleto de ameaças e problemas sociais, que João XXIII redigiu a encíclica Mater et Magistra.

Pacem In Terris - Este documento pontifício defendeu também o desarmamento, uma distribuição mais equitativa de recursos, um maior "controlo das políticas das empresas multinacionais" e várias "políticas estatais que favoreçam o acolhimento dos refugiados"; reconheceu de "que todas as nações têm igual dignidade e igual direito ao seu próprio desenvolvimento"; propôs a construção de uma "sociedade baseada na subsidiariadade"; e incentivou os católicos à acção e à transformação do presente e do futuro. Esta encíclica exortou também "os poderes públicos da comunidade mundial" (sendo a ONU a sua autoridade máxima) a promover o "bem comum universal", através de uma resolução eficaz dos vários problemas que assolam o mundo [5] -  João XXII

A encíclica é dedicada à cooperação entre os povos e ao problema dos países em desenvolvimento. O texto denuncia o agravamento do desequilíbrio entre países ricos, critica o neocolonialismo e afirma o direito de todos os povos ao bem-estar. A encíclica propõe a criação um grande Fundo mundial, sustentado por uma parte da verba das despesas militares, para vir em auxílio dos mais deserdados. – Paulo VI.

Populorum progressio é uma das encíclicas mais importantes da historia da Igreja Católica ainda que tenha suscitado críticas ferozes nos meios mais conservadores, particularmente quando admite o direito dos povos à insurreição revolucionária, nos casos de tirania evidente e prolongada que ofendesse gravemente os direitos fundamentais da pessoa humana e prejudicasse o bem comum do país -  Paulo VI(Wikipédia)
(Wikipédia)

(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)




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