Desde a criação do Parque Municipal
Peixoto Filho, em 17 de outubro de 1909, a Praça central da cidade passou por
diversas transformações. Teve seu esplendor quando as árvores tiveram a idade
adulta, com as belas palmeiras imperiais bem ao centro, e as várias espécies
distribuídas ao redor até a beira das calçadas, frondosas e contribuindo para o
cenário bucólico, embelezado por tantos canteiros gramados e floridos, entre os
quais havia as passagens que ligavam a área em torno do coreto às laterais.
Até o início dos anos 60 do século
passado o interior do Jardim não tinha calçamento. O povo convivia bem com aquela situação. As
ruas principais que levavam à periferia também eram de chão. Na estiagem, poeira;
na época das chuvas, barro. Quem se
acostumava a ir ao Centro, ou ao Largo, como diziam muitos, pisando na terra
molhada ou seca, não se importava em passear somente nas calçadas em volta do
Jardim.
Os hábitos da época facilitavam a
convivência com a singeleza naquela mistura de um rústico quase rural com
aquele aspecto de “missa na Matriz”, o movimento na Estação na hora do trem e
as poucas horas da noite com as calçadas, onde os rapazes passeavam por fora no
sentido anti-horário, e as moças por dentro, no sentido horário. Dali surgiam
flertes, encontros, namoro nos bancos de réguas ou caminhando em passos tranquilos
entre os canteiros.
Frequentar bares era coisa somente para
homens. As moças tinham hora para voltar
pra casa, não mais que depois das 10(22 horas).
Os rapazolas iam conhecer a intimidade feminina nas casas de mulheres da
chamada “vida fácil”, que tinham liberdade para sair às ruas somente depois das
onze horas(23). Era ordem da polícia.
O cinema servia de opção de lazer
cultural para as pessoas solitárias, ou para os namoros escondidos, a depender do
tipo de filme em exibição. De segunda a sexta-feira, passavam romances,
policiais, faroeste. Aos sábados, os
seriados de aventura, ou de ficção científica, antecedidos pelo jornal da
semana - na maioria das vezes defasado pelo tempo – e por histórias de “bandido
e mocinho”, muito identificados com público da zona rural e da periferia. Os domingos eram reservados para os grandes
clássicos da Sétima Arte, de temas históricos, bíblicos e lendários, protagonizados por Victor Mature, Humphrey Bobart, Rita Haywort, Sophia Loren, Anthony Quinn,
Elizabeth Taylor, Robert Taylor, Lana Turner, Errol Flynn, Bette Davis,
Marcello Mastroiani, Burt Lancaster, Rita Hayworth, Katharine Hepburn, Jack
Palance e tantos outros que imortalizaram “Êxodos”, “Sansão e Dalila”, “A
Bíblia”, “A Caldeira do Diabo”. “Adeus às Armas”, “Cristóvão Colombo”, “Demétrius
e os Gladiadores” e tantos deste naipe.
Os prédios das residências, casas comerciais e instituições públicas da
Praça faziam por si só um conjunto harmonioso da arquitetura de uma época que
deu status social à cidade, apesar de ter a maioria dos habitantes na zona
rural. O neoclássico predominava nas molduras, nas fachadas, nos muros e no
marcante balaústre que envolve o adro da igreja matriz, como mensagem silente da
filosofia dos iluministas que haviam lutado da maneira como puderam pela
liberdade e pelo culto da razão.
Até os coretos mais antigos tinham o
toque artístico daquele conjunto de madeira, cimento e massa que falavam.
Também pudera! Não é à toa que Visconde do Rio Branco, o José
Maria da Silva Paranhos, era autor da Lei do Ventre Livre, a mais importante e
eficaz para o fim da escravidão. E 28 de
Setembro foi a data dessa Lei em 1871; e foi a mesma data para a Lei do
Sexagenário em 1885. Ambas, com o tempo, tornariam livres todos os cativos,
independente da Lei Áurea que somente fez antecipar em 13 de maio de 1888.
Visconde do Rio Branco e Praça 28 de
Setembro
simbolizam a liberdade para tirar a mancha do lugar que antes servira de
Presídio para presos políticos e criminosos comuns do tempo do Império.
Aquele
cenário original tinha uma identidade que ficou maculada, desfigurada, com o
prédio da antiga estação rodoviária e a construção de um coreto de alvenaria
moderna no seu interior. Feriram de
morte o bucolismo do jardim, o Parque Municipal Peixoto Filho, nos anos 50 e 70
do Século XX. E, mais recentemente, a
derrubada de prédios históricos no entorno da Praça, do lado do Grupo Carlos
Soares, para funcionar um estacionamento de carros; do lado do cinema todo
aquele conjunto que serviu para cenário de filme de época - e que tinham
identidade histórica, para dar lugar a construções desalinhadas, sem limite de
altura, e sem qualquer padrão de harmonia, como também atrás da Igreja Matriz,
formam um caos arquitetônico que nada tem de moderno e agride o histórico, o
tradicional, a imagem da liberdade e da razão.
E ainda se aguarda o que virá depois da derrubada da Casa Telles(Telles
& Mesquita) e do Hotel Braga. Por enquanto, telas de arame estabelecem os limites de seus lotes.
A paisagem urbana não é mais aquela
Visconde do Rio Branco mantém o título
e perde a nobreza, ao sentir-se impingido a retroceder à condição de Presídio
da especulação.
(Franklin Netto – viscondedoriobrancominasgerias@gmail.com)
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