segunda-feira, 26 de agosto de 2013

COLUNA DO PAULO TIMM(Torres-RS) - Drops Revista Diária agosto 24/26 - VARGAS, HÁ 59 ANOS / 24 de agosto, recordando

COLUNA DO TIMM

 Drops Revista Diária agosto 24/26 - VARGAS, HÁ 59 ANOS

HÁ 59 ANOS SUICIDAVA-SE VARGAS E EU QUASE LEVO A CULPA

Paulo Timm – Torres 24 ago 1954 - copyleft



Há 59 anos, eu tinha nove anos de idade, morava em Santa Maria RS e saí à rua, devidamente paramentado com minha farda de lobinho (escoteiro infantil) , sem saber o que estava ocorrendo. Enrolado no pescoço eu tinha um lenço vermelho, com listras brancas em volta, símbolo do meu grupo , denominado ROQUE GOZALES. Saí , lépido e faceiro, " a caminho de mim" , como sempre fazia. Não me lembro bem que dia da semana era. Tinha um jeito de sábado de manhã, mas não tenho certeza. Quando cheguei na Rua do Comércio , centro da cidade, me deparei com um grupo de manifestantes raivosos. Eram ferroviários. Eles haviam subido a Rio Branco, vindos da Estação Ferroviário, então pululante, e estavam exaltados pela morte do Getúlio. Quando me viram com o lenço vermelho, símbolo " maragato" , contrário ao Getúlio , que era " chimango " , foi um horror. Me acusavam de assassino, ma amaldiçoavam, me xingavam e eu, não entendia nada... Por sorte era muito pequeno e alguém me protegeu dizendo-me pra correr pra casa, duas quadras abaixo, na descida da Cel. Niederauer, na mesma casa que ainda hoje lá está e que visitei recentemente. Fiquei assustado. Esbaforido. E me tranquei em casa. No almoço contei pro meu pai, um severo Major do Exército, anti-getulista ferrenho, o ocorrido e ele me repreendeu: - Poderias ter morrido, guri! Aí expliquei-lhe tudo e disse que eles apontavam, rancorosos, para meu lenço vermelho. Meu pai, então, me explicou: - Esse lenço aí é símbolo maragato. Te salvaste por pouco. Quebraram muita vidraça lá na Rio Branco. São adeptos do Getúlio que culpam os maragatos pelo seu suicídio.

Ficou o registro. Aquietei-me. Muitos anos depois, me perguntei, já ao lado do Brizola, junto de quem e sob cuja liderança fundei o PDT ainda no exílio dele, em Lisboa - 1979: - " Ué, mas o lenço vermelho não é maragato? " Brizola então me explicou que o lenço branco como símbolo chimango já estava enterrado em S. Borja com a História. Desde 1930 , maragatos e chimangos se uniram em torno a Vargas para a Revolução de 30. E nos anos 50 e 60 o vermelho era mais adequado a um partido popular como o PTB. Adotei-o. Tempos depois descobri, também, que o pai de Brizola era maragato e fora morto pelos chimangos na Revolução de 1923... Enfim. Um pouco de História neste dia em que , há 60 anos Vargas saía da Presidencia para entrar na HISTORIA. E que assim registrei nas minhas “Lembranças”, dedicada aos meus amigos daquela época  J.A. Pratini de Moraes, Jorge Marino e Jorge Chagas.

1955-1960
Ia adiantada a década dourada dos cinquenta
Mas ainda pipocavam no meu cotidiano as escaramuças de 54.
Aquele agosto amargo de ressentimentos:
O suicídio do Pai-dos-Pobres.
-“Getúlio Morreu... ! Getúlio Morreu...!”
Retratos dele  ainda  por todos os lados.
Nas barbearias – Ah ! ... A da General Câmara ...! -
Meu  cabelo começando a   transgredir  onduladamente,
à James Dean, que brilhara em “Juventude Transviada”.
O pente , companheiro inseparável da carteira,
Ambos cuidadosamente guardados no bolso de trás das calças.
Calças rigorosamente frisadas, folgadas, ternos de casemira.
Alfaiates elegantes, com sotaque italiano.
Onde andará o Silvio, o mais elegante, o mais exímio?
Será que lhe fiquei devendo  alguma grana?
Sapatos rigorosamente cuidados:
Engraxate era uma profissão digna, indispensável.
Pelé brilhara , em 58, na Copa da Suécia, no meio do mandato JK .
Nós o acompanhamos, grudados num  “SPICA”, radinho de pilha ,amostra do milagre japonês  que se anunciava.Eu, Jorge Chagas, e Arnaldo,
No stand de vendas de um prédio em construção  defronte o  Sevigné,
Onde este já trabalhava  e víamos a saída das gurias de saias plissadas
(Éramos todos  duros, filhos de uma classe média vinda do interior;
Coisas da vida:  doença de um irmão, uma  mãe  viúva, um pai meio torto,
um olhar adiante ...)
E  “Pelé” virara, já naquele tempo ,alcunha dos tiziús marcados pela pobreza
Mas o Pelé da Praça Daltro Filho, junto do  Cine Capítólio, seria imbatível  malabarista do ofício, mestre do brilho, prestidigitador da escova.
“Pelés”  engraxates por todas as praças,  nos cafés , pelas artérias do Centro,
O mesmo Centro onde pontificava o Cinema Imperial, ao lado do “Ghilosso”,
Sucedendo-se  em telas de cinemascope cada vez mais impressionantes
E onde as madrugadas acalentavam a fome boêmia  nos balcões do “Matheus”
O salário-mínimo pagava a dignidade dos que dele viviam.
Quantos “baurus” não o teria comprado, às vésperas das eleições de 60?
Ou quantas “ média com pão e manteiga ”, o mata-fome da época?
Herança getulista  que faria a caricatura do  seu opositor vitorioso em 60: Janio Quadros.



-“Mataram Getúlio! Mataram Getúlio!...”
Não fazia ainda um ano da tragédia:
...“E desta  forma saio  da vida para entrar na História...”
Eu ia com minha mãe no bonde “Duque” sobre o Viaduto da Borges,
A mais simpática linha jamais inventada,
junto  com “Um Bonde Chamado Desejo”.
E que  brindava os usuários com os campeões da gentileza no seu comando.
Ela me mostra as ruinas , à  esquerda:
- “Parece que era a Farroupilha, diz .Ou um Jornal. Não sei bem...”
Ainda morávamos em Santa Maria no fatídico dia de agosto
Mês em que os ventos gelados soprados do pampa arrastam consigo,
Como uma ventania de almas escorrendo dos Andes,
os “sôbolos rios que vão...”
Como se foi  meu avô Afonso , filósofo de camisola, para quem
“-A vida era um manancial inesgotável de ilusões”
E se foi , também , meu sizudo e tossilento vô Alvaro,
Um atrás do outro, a marcar-me duplamente a impressão das primeiras perdas.
Ela , minha mãe , pouco sabia de Politica.
Menos de Porto Alegre, onde chegamos no início de 55.
Mas nunca perdoaria o “Velho” de ter morrido justo no dia do seu aniversário.
-“Desgraçado!”, bradava. E me mostrava os escombros ,acima do Viaduto.
O mesmo viaduto que eu mal sabia fosse atravessar tantas vezes na vida.
Onde as ruinas dos “Associados” ficariam anos a fio:
um amontoado retorcido de ferros e  esperanças enterradas com Getulio      testemunhando  a dor  incontida  dos deserdados,
Inconformados com a brutal agressão,
Ao símbolo nacional que  “ele ”se convertera .
Mas ainda não seria daquela vez...
A década chegaria impávidamente dourada até o seu ultimo suspiro.
Os tempos  comprovariam.
Quem viveu, viu.
A História registrou
A firmeza da “espada de ouro” brandindo em novembro  a posse de Juscelino
Cortando com precisão as dores do momento,
Tormento de todas cores:: saudades de Santa Maria  que ficara atrás,
Misturadas com as “Dores” da Paróquia  e do Colégio que me acolhiam,
Na enxaqueca da minha mãe, na brotoeja  da irmã caçula que tossia.
Tudo um imenso rastro de dor...

Getúlio não morreu.
Virou mito.
Superou o tempo cronológico dos mortais para entrar na eternidade e,
Dos bustos de bronze espalhados por toda parte  comanda as eleições de 55, faz seus sucessores:
Juscelino  é Presidente.,
Jango Vice.
A cautela mineira abrigando o  ímpeto missioneiro
(Todo o cuidado era pouco numa a conjuntura  entupida de conspiradores)
Com as mesmas bandeiras chamuscadas pelo ódio oligarca
Que pretendia sufocar o ímpeto desenvolvimentista
Da afirmação :
Da cidade sobre o campo,
Da industria sobre a agricultura,
Do investimento sobre as exportações ,
Do engenheiro, agora revestido de geólogo e economista ,sobre os bacharéis.
A inversão do vapor elegante pelas boléias desconfortáveis que já singravam o interior,
Pioneiras nas “baratas”, como a do Velho Chico Timm, meu primo,
Depois, aos solavancos do “Bye Bye Brasil”,
A história resgatada,
A esperança abrindo caminho., estendida sobre um novo horizonte.
A dignidade  mortalmente ferida recuperada,
As trinta metas começando a ser celeremente providenciadas
A meta-síntese de sua ideologia – Brasília – começando a ser  erigida
Do alto do Planalto Central, vertente de muitas águas
De onde jorraria leite e mel de uma nova civilização sonhada por Dom Bosco. Cinquenta anos em cinco.
O gigante desperta.
O Brasil se agita:
Os “reacionários” resistem à mudança. Reagem.
Estimulam levantes militares: Aragarças ,Arapongas e outros , mais velados.
Mas 60 milhões de brasileiros, mais da metade no campo,
Aventura-se no salto da modernidade idealizada.
O Rio Grande lhe respalda,
Porto Alegre honra  a tradição federalista, secular, progressista: racha o PSD,
Consagra Loureiro da Silva, Pasqualini e  Fernando Ferrari no PTB,
E se prepara para fazer Prefeito um fogoso engenheiro da Pensão da Densinha



Pôrto Alegre  agiganta-se. Se excita: Exulta..
Por todos os seus poros
Principalmente na sua juventude que somava o esmero dos “anchietanos”,
de formação religiosa e melhor preparo,
sob o olhar amigo do Velho Padre Walter,
com a ousadia republicana  dos “julianos”,
onde proliferaria o populismo de boa vertente positivista,
inspirado naquele gigante da Primeira República que lhe legara o nome:
Julio de Castilhos.
O discurso veemente substituindo-se às letras  da “Província de São Pedro”,
O Rio Grande seguindo seu curso cívico:
a rima cedendo lugar às palavras de ordem.
O pêlo duro , o filho de colonos, o recém-chegado,
todos plebeus,
impondo-se,  gradualmente, nos salões da época
Massa e velocidade sociais  num novo  ritmo:
De “Guerra Fria”: Famílias divididas
“Átomos para a Paz”: Somos todos irmãos
Brizola Prefeito  seria  apenas um signo destas mudanças.
Suas palestras ,  mais tarde, um rito na casa da Dona Eloá, mãe do Sotero,
- Ali na Rua da Praia, defronte o Majestic , reduto do Quintana -
Embora eu as assistisse mais pelo prazer da companhia da filha Carmem,
Cujos cabelos de fogo , inteligência matreira e corpo escultural
Me empolgavam : Caí de amores.
Ahh! Rua da Praia...!,
“Que não tem praia, que não tem rio ,”
e onde as “sereias” começavam a usar apertados “slacks”
para espanto de seus escandalizados pais:
“-Isto é coisa de meretrizes “, enfatizavam, contrafeitos.
Mas já era tarde. A liberação das mulheres  estava acontecendo..
Rua da Praia:  um monte de gente   indo e vindo, parando pro cafezinho,
aglomerando-se no canto da Praça da Alfândega
em torno das rifas de irresistíveis “rabos de peixe”
(cinematográficos carros importados que  incitavam o “american way of life”)
destinadas a construir o Estádio Olimpico ou outros sonhos.
A década seguia seu destino. Usava-se  smocking ,
(Ainda o guardo em algum lugar, vi-o no armário de minha mãe pouco antes de ela ir-se )
Claro , nos grandes bailes , como o de debutantes,
Nos grandes clubes:
o do Comercio, o mais disputado
O  do Leopoldina Juvenil, nem pensar, era outro mundo,
O do Petrópole e da Sogipa, aí sim, se podia ousar...
Desde que se fosse “sócio-atleta”, com a vantagem de usufruir a pisicina .
Mas eram as reuniões dançantes ,nos bairros , as mais disputadas
Coincidindo , às vezes, com um aniversário de 15 anos
Ao qual jamais se levava qualquer presente. Um Chanel nº 5? Estôjo ?
Ainda assim ,era-se bem recebido, mais ainda se bem vestido,
Quando não flagrado “penetra”.
Os primeiros olhares maliciosos, rostos colados, um aperto na cintura,
A porção do paraíso no bate-coxa de um autêntico bolero, um compassado samba canção- “Você se lembra...?” – Lupicínio impera,
E pequenas vitrolas entoando vozes vibrantes de uma época estonteante
Como a de Cauby ,reverberando C – o – n – c – e – i – ç – aaa – uuu..!
Só superado pela eletrização provocada pelos primeiros acordes do Rock
Então chamado literalmente rock-and-roll .(Viemos ao mundo  com Elvis).
E que nos transformava de pés-de-valsa consumados em malabaristas de pistas
As meninas balançando loucamente as pernas ainda pudicamente cobertas por vestidos abaixo dos joelhos
esvoaçando-as a ponto de nos tirar o fôlego.
Então redobrávamos os esforços ,
Ficávamos mais malabaristas,
.Mais ousados.
Sem saber , ficávamos também mais republicanos,
Mais urbanos.
Mais eufóricos com a liberdade.
Animados por doses redobradas de Cuba-Libre,
às vezes intercaladas por um desajeitado conhaque ,
que só não nos levava à nocaute pelo ardor da idade
que a tudo se sobrepõe.
Só não se sobrepondo
Às  incursões clandestinas aos casarões da Sete de Setembro
Às vezes espichadas aos segredos gardelianos da Voluntários da Pátria
Na Casa dos Barbantes, ou na Velha Botafogo...
De onde sobrevinham incômodos ...


Mas não havia nenhuma maldade nisto,
nem verdadeiro pecado.
Apenas um processo de iniciação numa cultura em transição.
Começo da vida,
Os primeiros amores frustrados na embriaguês da noite espêssa
Que ainda não chegava a empedrar-se em solidão,
Nem produzir fantasmas sombrios e ameaçadores,
Nem destilar-se em sofrimento.
Qual tormento?
Só promessas, ilusões, a vida fertilizando-se a cada instante.
Não raro uma incoerência, até uma maldade
(Apesar dos esforços do Fulvio Petracco, o“geninho”,em fazer-nos escoteiros, levando-nos a descobrir o Hampel, em São Francisco de Paula)
Quando uma “revoada” de meninos juntava-se todas as tardes
No Bar “Rio de Janeiro”, os mais aprumados:Camilo,Goldoni,irmãos Krieger
Os mais moleques no Bar do Seu Armando português para passar o tempo:
Brandão, Zé Nogueira, os gêmeos Seadi, o  Leopoldo, o Sansão
Incomodando os transeuntes,
Dando “nó de biscoito” nos fios do bonde na subida da Duque
“Enturmando” nas meninas dos colégios:o Paula Soares, o Ernesto Dornelles.
O maior prazer nos passeios  matinais de  Domingo, no carro dos pais
Uns , como meu pai ,compreensivos desta ansiedade, generosos,
Outros francamente permissivos,
A maioria intransigente.
O meu Velho Austin –A 40, saudade pungente
Sobre o qual me fiz destro desde os tenros 13 anos
Sem que tal se constituísse em escândalo
Nem eu em desvairado vândalo.
O Nash do Madeira (!) , no alto da Bronze , que eu tanto invejava
Como pouco tempo antes embasbacava diante da vizinha  genial no “Clube do Guri”, no Auditório da Farroupilha. : A notável Eliz....No mesmo dia em que o apresentador sobressaltado dizia que os russos tinham lançado o “sputnik”.
Mas acima de tudo o flamante Bel-Air do meu verdadeiro irmão destes 57,58
O Jorge Marino, do “Vista Alegre”, na subida da Duque,
Um verdadeiro primor da tecnologia em azul e branco anunciando-se pelo tilintar de uma sininho de lambreta, então na moda.
Todos condenando-me , pela  paixão pelos carros antigos:Meu Landau....!
Como se desta forma pudesse recuperar um tempo mágico,
De incontida alegria.

Chegamos a 58.
Júbilo por toda parte:Cinema Novo, Bossa Nova, Manchetes ,Marta Rocha...
Mas nem tudo são flores .Há inflação.O clamor contra a seca.Denúncias.
Acometem-me as primeiras preocupações,
Ainda mais sociais do que existenciais:
Para onde vamos?
Como acelerar o progresso, administrar a pobreza,
Acabar com as filas,
As vezes do leite, às vezes da carne.
A roubalheira é mesmo assim tão grande?
A idéia de que existe uma alternativa,
Uma verdade histórica inarredável
Para onde tendem os povos começa a me dominar.
Mas ainda não tenho este certeza.
Pai militar, familia pequeno-burguesa pouco ilustrada,
Eu  tinha pouco instrumental
Para situar-me neste  turbilhão de acontecimentos
Que me rodeavam, tonteavam, martelavam,
Fazendo-me e a meus contemporâneos matérias primas do tempo.
Os jornais “apelam”,
Juca Chaves não perdoa,
E , acidamente, reverbera  em Porto Alegre sua toada crítica
As marchinhas dos carnavais de 40 dão lugar à Nara Leão e João Gilberto
Os ânimos se acirram:
A classe média  porto-alegrense se refugia no conservadorismo.
O espectro da massa suburbana avulta
Numa dimensão  que me era até então estranha.
Eu,
Que vinha de Santa Maria, onde a pobreza tinha  um lugar definido,
Que  vivia no Alto da Bronze,
Circundado pela pobreza do Cadeião do Gasômetro, da 7 de setembro,
O Pôrto.
Onde filhos de apenados , prostitutas e algumas famílias miseráveis
Coloriam, apenas, o primado da classe média.
Eram meus amigos: “Jornaleiro”, o “Zé-da-Ilha” e outros.
Mas eu , agora, via a cidade toda.
Crescendo, pulsando... Ameaçando....
Com discursos inflamados
E expectativas crescentes. Que fazer...?


O “Julio de Castilhos” era o melhor colégio
“-É para lá que eu vou, disse a meu pai.,
Lá a gente se prepara melhor”.
Era o que se ouvia, se dizia, se acreditava.
“Você se lembra? Foi isso mesmo que se deu comigo...” E não me arrependo.
Como o Colégio, pegou fogo.
Eu me  inauguraria com o novo prédio , na Azenha, em 1958.
Amplo, aberto, como se nunca fosse envelhecer
Eu fazendo-me definitivamente homem ,definitivamente público,
Graças  às figuras mais fantásticas desta transição
Que me iriam ensinar as letras de um novo tempo
Regando minha sociabilidade com os temperos da percepção política:
Aqui uma mãozinha na campanha para deputado do pai do meu melhor amigo,  João: o austero Adail Morais, para mim , então, um monumento.
Ali ,uma discussão acalorada sobre a “Revolução” comandada pelo Marco Aurélio G., já notório “comunista” e com quem iria reencontrar-me tantas vezes vida afora, mundo adentro: No Chile, Em Paris...No Paraíso....?
Lembram do acampamento em solidariedade à Cuba...?
Ah ! O Trajano, O Tabajara, o velho Marcão, os nomes me escapam...
Outras vezes, uma rodada de  discussões sobre o futuro de cada um de nós...
E tudo acabava em excursão.
Pois os sonhos já não cabiam nas fronteiras da cidade, cada vez menor
para todos nós,
Chegavam  ao Uruguai, ali do lado, mas além da linha do horizonte...
À própria Argentinha.
Então reacendiam nossos humores mais adultos, sem temores,
Na organização de tamanhas façanhas
Na montagem de estrito planejamento de viagem
(Planejamento, aliás, era uma palavra revolucionária) :
- A cobrança de longas e penosas mensalidades para custear os passeios   -
Na fruição das novidades que se sucediam na viagem
Ainda guardo algumas fotos para certificar-me de que não foram devaneios
Nos sabores das noites escondidas nas dobras de Rivera e Montevideo,
A surpresa diante do discurso de uma autoridade enaltecendo o contrabando...
Tudo  seguido com atenção por um camarada de outro mundo,
Para nos aguentar nestas aventuras: Ah! O Professor Roussigno
Pudesse um dia – nem que fosse na eternidade – encontrá-lo,
Abraçá-lo, agradecer-lhe,
Por nos ter  ajudado nesta vivência coletiva da liberdade...
E lá se ia a década. E com ela nossas primeiras descobertas...
Os mistérios da adolescência misturando-se com  o passado e o futuro
O Ser criança e o Ser adulto.
Passar para o “científico”, ou  o “classico”, os últimos anos do II ciclo,
Era ultrapassar uma fronteira tênue
Intensificando  a transição., prolongando-a mais três anos
No próprio Colégio
Até chegar à Universidade.
Mas para alguns  era não o fim, mas um novo caminho
Que abreviaria a própria  adolescência,
Uns se iam porque precisavam trabalhar, ganhar a vida logo, ajudar em casa.
Os que já tinham 18 anos , não muitos, os mais velhos
Pensavam no concurso do Banco do Brasil, ou no Estado.
Ou iam “servir”, ser vendedor  (da Olivetti.) ,ou Propagandista  Médico.
E , pasmem, até começavam a casar : O “Gatão “ e a Norma....
Havia , também a carreira militar rápida,
Principalmente quando os pais indicavam os caminhos já trilhados.
Elói , Joel, e Wolmer, por exemplo, foram para a Brigada Militar.
Em três ou quatro anos seriam Oficiais.Vida feita.
Eu e alguns poucos, como o Régis,  confidente de décadas, fomos para a Escola de Cadetes, na Redenção.
Ficaríamos independentes .
Adultos antes do tempo
Enquanto isto, Fidel no poder prenuncia anos de chumbo grosso    ‘
Imagens chocantes: Paredón, fuzilamentos ,
Simpatia de uns, os “politizados”,
Dúvidas da maioria, menos “informados”
Eu, decididamente,indeciso...
Já se vêem na rua os primeiros Volks nacionais, Brasília apronta-se:
Naves de concreto  pousando suavemente no sertão  impressionam o mundo,
A natureza agredida se vingaria derrubando uma árvore: na Belém-Brasília,
Que ceifa a vida do grande pioneiro Bernardo Sayão.
Imensas represas prevêem o fim dos racionamentos de energia.
Mas  também se fala em crise : –“ JK é a sétima fortuna do mundo!...”: Reação, Reforma, Revolução ?Aturdido, curioso ,como um pinto calçudo,
Aos 15 anos ,vou em busca de mim e brindo, festivo ,a entrada de 1960.
Adeus “Alto da Bronze”! Adeus “ Julinho!”
Adeus  formidáveis   amigos Chagas, Jorge Marino , João Alberto!
Adeus Carmem! Meu primeiro amor, minha primeira dor...!Adeus Maribel, Moema!
Inspirações dos meus melhores sonhos!


Carta-testamento de Getúlio Vargas
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
A Carta Testamento de Getúlio Vargas é um documento endereçado ao povo brasileiro escrito por Getúlio Vargas horas antes de seu suicídio, em 24 de Agosto de 1954.
Existe uma nota manuscrita do suicídio, e um documento datilografado "Carta Testamento", da qual se conhecem 3 cópias, que foi lido em seu enterro por João Goulart. Existe polêmica quanto a autenticidade do texto datilografado.
Cópia da Carta-testamento de Getúlio Vargas, 24 de agosto de 1954:
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Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre.
Não querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo, que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão.
E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História.





blog do Mario Magalhães 


História – Da direita à esquerda, imprensa pediu cabeça de Getúlio em 1954

Mário Magalhães

23/08/2013 13:12



( Para seguir o blog no Twitter: @mariomagalhaes_ )
Existe um livro chamado “Em agosto, Getulio ficou só”. Nunca o li, mas sempre apreciei o título bem bolado.

Neste sábado, 24 de agosto, o suicídio do presidente Getulio Dornelles Vargas completa 59 anos. A visita à imprensa da época evidencia que, se dependesse do radicalizado ambiente jornalístico, o gaudério de São Borja não teria mesmo como escapar. Ele foi deposto de madrugada, na forma de uma “licença”. Ao se matar, de manhãzinha, impediu os militares de assumirem diretamente o governo. Com o sacrifício, atrasou o golpe de Estado em dez anos.

Com muitas publicações levando para a internet suas coleções, e a Biblioteca Nacional botando no ar parte de sua hemeroteca, ficou mais fácil consultar os velhos jornais. Eles confirmam que o presidente sufragado pelo voto popular em 1950 estava acossado pela direita, principalmente, mas também pela esquerda.

Além da “Última Hora”, financiada pelo Palácio do Catete, então sede da Presidência, o “Jornal do Brasil” se opôs à iminente virada de mesa institucional. Não deveriam estar sozinhos, como um levantamento mais vasto demonstrará, mas quase.
As primeiras páginas abaixo são dos matutinos, em 24 de agosto de 1954, e dos vespertinos, na véspera. Isto é, as derradeiras edições antes do anúncio do tiro no peito. Nem todos os links, que permitem ler o jornal inteiro, têm acesso livre. Não encontrei na hemeroteca digital, ainda incompleta, a “Tribuna da Imprensa”, propriedade de Carlos Lacerda, opositor obstinado. O site da Biblioteca Nacional demora anos-luz para baixar as imagens. Minha assinatura venceu, e não pude ir além da capa de “O Estado de S. Paulo”.

O jornal mais panfletário foi o “Diário Carioca”, que saiu com o minieditorial “Reú, renúncia, rua”. A demissão do presidente seria “exigência da consciência nacional ante a vergonha nacional e internacional a que o governo dos Vargas arrastou o Brasil”.

Detalhe da primeira página do “Diário Carioca”

O Globo” também deu editorial pedindo a cabeça de Getulio. Ofereceu duas opções: “por um ato de sua livre vontade” ou “sob coação das circunstâncias”. Em caso de derrubada, o Brasil continuaria na condição de “um estado juridicamente constituído”.

O “Diário da Noite” pertencia à rede do magnata Assis Chateaubriand. Fiel escudeiro de Chatô, o jornalista Austregesilo de Athayde pontificou, em sua coluna: haveria “podridão do governo” e “negociatas do chefe da Guarda Pessoal” do presidente. Aconselhou interferência militar: “Atentem nesse índice a opinião e as Forças Armadas, a fim de ajuizarem corretamente a anarquia moral em que se encontra submerso o país”.

Na polarização da Guerra Fria, os três diários mencionados estavam ao lado dos Estados Unidos. Porém, a “Imprensa Popular” (li em arquivo físico da Universidade Estadual Paulista), pró-União Soviética, também conclamou pela derrubada de Getulio. Ou seja, pelo golpe. Na manhã de 24 de agosto, o jornal republicou uma entrevista do principal líder comunista, Luiz Carlos Prestes. Seu partido, então banido, editava a “IP”. Embora denunciasse “os golpistas” em geral, Prestes defendeu, mimetizando Lacerda, “pôr abaixo o governo Vargas”.

Os paulistanos “Folha da Manhã” e “Folha da Noite” noticiaram os movimentos do presidente e as ações dos conspiradores golpistas, mas não tomaram posição explícita, pelo menos que eu tenha reparado.


Como era seu padrão, “O Estado de S. Paulo”, histórico contendor de Getulio Vargas, dedicou a primeira página ao noticiário internacional.

No Rio, o “Jornal do Brasil” também tinha suas idiossincrasias, reservando quase toda a capa para anúncios de arrumadeiras, copeiras, choferes e jardineiros. Foi a única publicação consultada com a informação da queda de Getulio, mas não da morte. Fechou depois das cinco da manhã. A manchete: “Renunciou o presidente da República”. Não havia renunciado, mas havia fogo sob a fumaça. Em editorial, o “JB” se opôs à deposição, porque inexistia “conhecimentos dos fatos”, sobre o atentado contra Carlos Lacerda no começo do mês. Sem conhecê-los, seria temerário opinar acerca de “quaisquer das soluções de natureza constitucional que as crises imponham”. Jamais se provou que Getulio soubesse do plano contra Lacerda.

Na internet, só encontrei a “Última Hora” em um trabalho acadêmico. A manchete histórica: “Só morto sairei do Catete!”. No dia seguinte, o jornal estampou: “O presidente cumpriu a palavra: ‘Só morto sairei do Catete!’”.

Se permitem um pitaco, são legítimas todas as apreciações sobre Getulio Vargas e seu legado, que estamos conhecendo melhor com a trilogia de fôlego que o jornalista Lira Neto vem publicando, pela Companhia das Letras (acaba de ser lançado o segundo volume, relativo ao período 1930-45). Mas o aspecto central em 1954 é o golpe de Estado contra um presidente constitucional.
Getulio não era mais o ditador da quadra 1930-34 e 1937-45, em tantos ângulos deplorável ou mesmo asqueroso. Era um governante eleito pelo povo. Sua derrubada fez mal ao país, que desprestigiou a democracia. E aos trabalhadores, cujas conquistas haviam se acumulado na administração democrática do presidente que saiu da vida para entrar na história.

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