terça-feira, 13 de agosto de 2013

COLUNA DO PAULO TIMM(Torres-RS) - Drops agosto 14 - NOSSAS CIDADES PEDEM SOCORRO - Drops REVISTA DIÁRIA agosto 13 - FIDEL, 87 ANOS DE DIGNIDADE



 Drops agosto 14 - NOSSAS CIDADES PEDEM SOCORRO


NOSSAS CIDADES PEDEM SOCORRO
Em todos os lugares onde vou a grita é geral”

Paulo Timm – Torres /RS agosto 14 - copyleft

As  manifestações de junho passado, apesar do mal estar  ( ou até mesmo por causa...) que provocou nos Governantes, um deles o Governador Cabral, com 12% de aprovação,   na berlinda, foi um divisor de águas na conjuntura nacional. Equivalem, historicamente, ao suicídio de Vargas, em 1954, à passeata dos Cem Mil no Rio de Janeiro, em 1968 e ao Movimento pela “Diretas Já”, entre 1983-84. Ainda é um pouco cedo para se avaliar o processo, mas ele repercute em vários campos: A COPA de 2014, a sucessão da Presidência da República e Governadores, comportamento da Economia, percepção dos intelectuais interna e externamente, aqui registrando a aguda e pertinente crítica de James Petras, ícone da esquerda mundial sobre o retrocesso representado pelo PT ,  etc. Cuide-se, pois, o PT, como cabeça do corpo político nacional, pois sobre ele recaem não mais esperanças, outrora nele depositadas  , mas as reticências da nação. E de nada adianta, ingenuamente, a Presidente Dilma esbravejar ou comparar os dados de emprego da Era Lula x Era FHC. Ninguém, a não ser os cegos pela ideologia e preconceito, tal como os Reinaldo Azevedo, nega os avanços sociais realizados pelos governos petistas, como não nega, também, papel positivo dos tucanos no controle da inflação. Mas isso tudo são águas de março, já passadas e lavadas que sobrenadaram o tempo , que hoje é outro. É de reacomodação de  expectativas , com alargamento de horizontes . Importante análise do momento foi a entrevista da Professora Ermínia Moricato, da USP, autora de “O Impasse da Política Urbana no Brasil “ (Editora Vozes) , publicada por Rose Spina na Revista “ Teoria e Debate” e reproduzida na Carta Maior. Ela não fala sobre Política e seus protagonistas, nem torce por eles. Fala sobre o espaço, por excelência, das Manifestações de Junho, as grandes cidades brasileiras, evidenciando-as como um caos urbano , presa de três fatores: as demandas emergentes, o interessa das corporações laborais e do capital imobiliário e o estrabismo governamental dos últimos anos que não foca sobre o imperativo da Reforma Urbana mas apenas de sua superfície habitável. Diz ela:

Construímos, nos termos do capitalismo da periferia, cidades que são bombas socioecológicas devido à incrível desigualdade e segregação – nos últimos anos, com o boom imobiliário, a prioridade dada aos automóveis, às obras viárias, e ainda elevamos o grau dessa febre, com os megaeventos, a Copa. Realmente, as cidades estão entregues ao caos, a interesses privados, e as condições de vida da maioria estão piorando muito.
A entrevista de Moricato é longa e profunda, mas pode-se pinçar algumas de suas considerações que apontam para as raízes da explosão política nas cidades. Sem querer interpretá-la pode-se inferir de sua fala que precisamente onde se concentra 80% da população brasileira, a maior parte de sua classe propriamente trabalhadora e parte considerável dos bolsões da miséria, a cidade brasileira, teve o seguinte itinerário na Política Governamental da União: Retórica e Experimental , numa primeira fase – 2003-2007; de Reação com o PAC , com investimentos de base que decolam a  construção pesada – 2007-2009 ; e Involução  e Desastre , com o MINHA CASA , MINHA VIDA – 2009-2013calcado apenas na construção residencial. Isto se refletiu na participação da construção nas taxas de crescimento:  Em 2008 o PIB cresceu  5,2%, enquanto o da construção foi   de 7,9%, invertendo-se em 2010 para  7,5% e 11,6%, respectivamente, graças à expansão do crédito imobiliário.

Ela mostra que o Governo Federal abandonou a preocupação com infra-estrutura das cidades deslocando sua atenção, exclusivamente, para  a  aquisição de moradia, aí incluindo a classe de renda de 5 a 10 salários mínimos, com vistas à redução do enorme déficit habitacional urbano , superior a 5,5 milhões de unidades.

 Com isso , sem os cuidados prévios quanto à reestruturação das cidades para abrigar as novas moradias, os preços da construção se elevaram sideralmente e a disputa por espaços em S.Paulo e Rio tornou-se verdadeiramente criminosa, expelindo os mais pobres para áreas cada vez mais distantes, na qual se expõem a um tempo  médio das viagens ( São Paulo )  de 2:42 horas, sendo que para  um terço da população esse tempo é de mais de 3 horas e em um quinto  alcança ao absurdo de mais de 4 horas.  Cita o blog Fogo no Barraco,  e o Observatório de Remoções de São Paulo como fontes nas quais se  mapeiam os incêndios em favelas e a valorização imobiliária, que chegou em pouco tempo a quase 185%  no Rio e em 151% São Paulo .

“ Em 2003, houve um retorno do investimento em saneamento, em torno de R$ 3 bilhões. Depois, em 2005, um retorno do investimento em habitação e saneamento. Em 2007, obras de infraestrutura urbana, com o PAC, e, em 2009, o programa Minha Casa, Minha Vida.

Como a recuperação do investimento se dá sem a reforma urbana, que tem como ponto central a questão fundiária e imobiliária, acontece do jeito que o diabo gosta. A apropriação principalmente da renda imobiliária e fundiária se dá por interesses privados e com aumento do preço do metro quadrado dos imóveis, que em três anos chegou a 151% em São Paulo e 185% no Rio de Janeiro. De 2009 a 2012, houve uma explosão no Brasil inteiro de preço do metro quadrado com despejos violentos, política que não esperávamos que fosse voltar tão rapidamente.
Moricato responsabiliza o Governo Dilma pela virada na Política Urbana que acabou transbordando nas manifestações. Para ela, o MINHA CASA , MINHA VIDA fortaleceu a visão meramente empresarial na Política Urbana, levando à explosão do crédito imobiliário e do boom da construção civil desordenada.

Com a finalidade explícita de enfrentar a crise econômica de 2008, o programa apresenta pela primeira vez uma política habitacional com subsídios do governo federal, e para tanto foi bem-sucedido.

A taxa de desemprego na construção diminuiu muito comparada ao desemprego em outras atividades. Isso não é pouco importante, a questão está nas empresas de construção e incorporação. Em 2007, dezessete delas abriram capital na bolsa de valores, compraram um estoque de terras e estavam justamente aguardando fundos para a construção de moradias. O programa responde a essa necessidade e as empresas passaram imediatamente a construir febrilmente.

O financiamento habitacional cresceu 65% de 2009 a 2010, e no ano seguinte, 42%. O montante de subsídio concedido de 2008 a 2009 foi de aproximadamente R$ 14 bilhões. Quando as empresas entram o salto é vertiginoso. Esse subsídio foi parar no preço da terra, porque na verdade no déficit de moradia da baixa renda, até três salários, não se mexeu ainda.


Acresça-se ao subsídio imobiliário, o equivalente à industria automobilística desde 2008, com vistas ao mero crescimento do PIB, mais os elevados custos sociais dos grandes eventos como a COPA e tem-se na cidade um cenário amedrontador. A frota de veículos aumenta cada vez mais, congestionando as cidades, mesmo de tamanho médio, retardando o tempo das viagens intraurbanas e metropolitanas, com duas conseqüências funestas: explosão no consumo de combustíveis, levando à PETROBRÁS -politicamente comandada às raias da falência- pela importação descontrolada de óleo e gasolina e estresse urbano.
Contando ninguém acredita, mas a velocidade média dos automóveis em São Paulo, entre 17 e 20 horas, em junho de 2012, foi de 7,6 km/h – quase a mesma de uma caminhada a pé. Durante a manhã a velocidade é de 20,6 km/h – de uma bicicleta. É um absurdo!

Os congestionamentos na capital paulista, onde circulam 5,2 milhões de automóveis, chegam a atingir 295 quilômetros de vias. Todas as cidades de porte médio e grande estão apresentando congestionamentos devido à enorme quantidade de veículos que entram nelas a cada dia. O consumo é incentivado pelos subsídios dados pelo governo federal e alguns estaduais para a compra de automóveis. Em 2001, em doze metrópoles brasileiras, somavam 11,5 milhões; em 2011, 20,5 milhões. Nesse mesmo período e nessas mesmas cidades o número de motos passou de 4,5 milhões para 18,3 milhões. Em diversas metrópoles, o de automóveis dobrou nesse período.

A entrevista de Moricato, enfim, é antológica e merece ser guardada como um dos registros mais oportunos de nossos tempos.
Na verdade, o que o Governo Federal não percebeu – ou evitou enfrentar , em nome da manutenção do emprego e da ficção do PIB de curto prazo acionado pelo consumo fácil  – é que o modelo rodoviário no Brasil estava esgotado. O salto da conta  importação de combustíveis é simplesmente absurdo – R$ 14 bilhões - , mais de 45 mil mortos em acidentes em 2012, doenças respiratórias que entopem a rede hospitalar pela inalação de poluentes. É no interior deste sistema rodoviário, também, que vicejam os grandes escândalos de Prefeituras e Governos de Estado, envolvidos com empreiteiras e concessionários de serviços públicos do setor.
É nas cidades, pois,  principalmente nas grandes metrópoles, que devemos fixar, doravante,  o olhar, se quisermos impedir que os níveis de degradação a que chegamos alcance um limite além do qual já não haverá Política. Simplesmente sua continuação por outros meios (...) cujo começo se registra, mas nunca se sabe, nem quando, nem como, terminará.


 Drops REVISTA DIÁRIA agosto 13 - FIDEL, 87 ANOS DE DIGNIDADE


FIDEL : O homem e a obra


Paulo Timm – Torres , agosto 13 - copyleft

       “ Fidel Castro foi para a     Política o que Picasso foi  para a pintura no Século XX.”
                                                       F. Ramonet , do Le Monde.

*

Há alguns anos Fidel Castro parecia estar morrendo.  Dizia-se que um câncer  lhe corroía a imortalidade. Naquela época comecei a rascunhar-lhe uma espécie de necrológio. Divulguei entre alguns amigos. Os mais à esquerda me condenaram veementemente, dizendo-me tratar-se, tudo, de insidiosa guerra da mídia conservadora.  Recuei e não dei maior divulgação ao esboço. Hoje, superado o fato, quando Fidel completa 87 anos , releio meu próprio texto e me proponho a revisá-lo, tornando, enfim, público. Meu propósito é evidenciar Fidel Castro como uma encarnação contemporânea de Dom Quixote, este, por sua vez, um clássico herói helênico.

Todo mundo, então, se perguntava, quando Fidel adoeceu: O que acontecerá , agora, com Cuba? O que sobrará  da obra deste vulto do século XX, que fez um Revolução Socialista nas barbas do Tio Sam, em plena Guerra Fria. E  que sobreviveu, sempre acossado, a mais de 15 Presidentes dos Estados Unidos; que conviveu com os grandes líderes soviéticos Kruchev. Brejnev, Gorbachev, com  Lumunba, Ho Chi Min, Mao Tse Tung;  com o maior filósofo de seu tempo – Jean Paul Sartre-, quem deixou seu testemunho no clássico UM FURACÃO SOBRE CUBA -;  que foi companheiro de lutas do mítico  Ernesto CHE GUEVARA, na Sierra Maestra;  que tinha em Salvador Allende, a quem visitou no Chile durante sua curta experiência socialista, um amigo – o que me permitiu vê-lo em pessoa e de viva voz no Estadio que se transformaria em matadouro de esquerdistas no Golpe de 1973. Fidel também acompanhou, atento, às vicissitudes da política brasileira, desde Jânio Quadros ( o qual até  condecorou Che em Brasília), Jango, Brizola e  Lula, a quem tem suposta e secretamente ajudado   e que fez do controvertido Hugo Chavez,  seu mais íntimo confidente...?

Não se sabe exatamente o que ocorrerá com Cuba. Diz um Premio Nobel de Economia, Gary Becker, que, “se as coisas fracassam acabam mudando”. E não foram pequenos ,os fracassos da Revolução Cubana, principalmente na esfera econômica. Então, mudará.  Que dizer do cerco às liberdades em toda a ilha?. Mas também houve êxitos. Entre eles o alto nível cultural de uma população – única na América Latina – sem analfabetos, com bom nível de assistência médica e impressionante porcentagem de pessoas com nível científico, só inferior à americana e israelense. Outra conquista da Revolução foi a reconquista do sentimento de dignidade do cubano, antes reduzido e pintado como lacaio de investidores externos ou de  gângsteres norte-americanos. Este sentimento se mescla com um orgulho do cubano simples de se sentir pertencendo à uma sociedade mais ou menos homogênea liderada por uma elite que se tem demonstrado senhora de uma austeridade inexistente em outras experiências revolucionárias ou no resto da América Latina e que, por isto mesmo, continua merecendo o respeito de seu povo. Fracassos e êxitos, pois, no distanciamento cada vez maior   do Grande Herói da Revolução Cubana, conduzirão à inevitáveis mudanças. E ficará a dúvida: Quem foi Fidel? O que representou ele? Como realmente era?

Fidel foi , talvez, a mais convincente síntese contemporânea dos ideais de virtude  ocidental, juntando a inspiração aristocrática helênica à boa nova cristã.

Para os gregos, a grande virtude, capaz de imortalizar seu portador, consistia na consigna:  dizer palavras e realizar ações. Este ideal foi cunhado na formação da alta cultura helênica com base nos valores de honra da aristocracia em luta pela terra e a distinguiu por onde se estendeu, principalmente no mundo romano. Tratava-se da Arete, que viria a inspirar Aristóteles na fundação da Ética.  Mas quis o cristianismo, que  vicejou no primeiro século dos Cesares, disseminando-se   entre as pessoas mais simples do Império ,  que a palavra – empenhada na fé - e não a grande obra, viesse a encarnar a figura do herói. Era a sublimação da morte na cruz pela salvação da humanidade.  Democratizava-se, assim, o ideal aristocrático adequando-o a uma sociedade que, por primeira vez na história, se massificara. E já não permitia manter grandeza de Roma em pé. Faz-se em frangalhos a grande obra material transfigurando-se no Império da Igreja. Mas não perde, jamais, a noção do heroísmo. Pelo contrário, o exalta pelo sacrifício de Cristo.  E não por  acaso, o ideal da revolução comunista, dezoito séculos mais tarde, quando, precisamente, Paris reeditaria em número o tamanho de Roma, ofereceria  o cenário para a reafirmação da virtude heróica.

A Revolução iluminista retomava a idéia helênica de grande obra como conquista popular por meio da razão. E o fazia pela palavra dos filósofos. Enaltecia a destruição do velho mundo como o caminho da prosperidade e dignidade humanas.  Cumpria-se, enfim, a afirmação grega de que o filósofo estava para o homem , como o homem para a natureza: O homem apoderando-se de sua história. E aqueles  que encarnassem esse desafio, passavam a ser  os novos imortais. Fidel foi, de longe, um dos mais emblemáticos deles. E, como tal, é um  dos grandes heróis dos tempos modernos.

Curiosamente, Fidel guarda, como duas de suas principais características pessoais ,o ser um homem extremamente bem educado e polido.

Todos os que conviveram ou que com ele tiveram contatos mais estreitos, especialmente F. Ramonet,  Editor do Le Monde Diplomatique, que lhe entrevistou longamente,  daí retirando o material para um livro lançado na França,  confirmam essas qualidades “nobres”  de Fidel. Ele nada dos modos rudes dos antigos líderes soviéticos, nem  muito menos com  os maneirismos exagerados  de lideres populistas do continente, à la Chavez, ou de La Kirchner.  Ele é, rigorosamente, um  aristocrata. E  é precisamente esta característica que acaba lhe atribuindo o pior defeito: o distanciamento.  Nada existe em torno a Fidel. Ele reina soberano envolto numa aura de quase sacralidade.  

Mas, ao mesmo tempo,  todos, fora os exilados em Miami, são  também unânimes em reconhecer seu compromisso na construção de uma sociedade igualitária em Cuba, revelando, aí, sua alma particularmente cristã. Paradoxo diante de um empedernido comunista? Não!  Já ninguém duvida que a  emergência dos ideais salvacionistas dos communards hodiernos proveio de fonte religiosa, embora revestido de forte anti-clericalismo  e um materialismo ingênuo. A obstinação communard  só fez seguir os passos do ideal cristão. Esta religião, o catolicismo, nos seus primórdios,  emergiu num contexto de grande turbulência espiritual. Roma pontificava no Século I DC , a ferro e fogo, sobre um território continental que ia da fronteira com a China à Europa –hoje – Ocidental uma pax laica , que convivia com intenso intercâmbio de crenças, superstições, divindades,  gerando tensões inusitadas, incrementadas pelo contágio com povos ditos bárbaros  e pelo instituto da escravidão em larga escala. Nesse contexto, a idéia da salvação, sob uma bênção que se distribuía indistintamente entre cidadãos e não cidadãos, romanos, senhores e escravos, nacionais e estrangeiros, homens e mulheres,, era simplesmente revolucionária. Custou o martírio nas arenas e câmaras de tortura. Mas desembocou na fusão da Boa Nova com a filosofia  e cultura gregas, presentes neste mesmo espaço desde cedo. E são estes mesmos ingredientes que aportam , pela via do Renascimento e do Iluminismo, ao século xx . Fidel é um filho dileto desta tradição, na mensagem de compromisso de salvação de almas e corpos, fundada no amor, alternando a construção de utopias com o uso da razão como critério da verdade.

Mas Fidel é , ainda, um espanhol clássico. A Península Ibérica sempre foi uma terra intensamente disputada  por cartagineses, romanos, árabes e , já no século XIX, pelos vizinhos franceses. Todos conhecem  a encarniçada resistência que os espanhóis ofereceram ao exército napoleônico. Seus próprios ocupantes nativos, dos quatro cantos da Ibéria, até hoje mantêm diferenças e disputas significativas. O espírito de luta permanente nesta terra gerou um tipo de personalidade sui generis no espanhol: sua forte disposição de luta. O conflito interpondo-se, sempre, como um atributo da firmeza do caráter. Mesmo quando os confrontos se elevavam para o campo fértil das idéias precocemente estabelecidas nos grandes centros de pensamento, já à época da ocupação árabe, fazendo do grande Averróis um precursor do iluminismo, o espírito espanhol se enrigecia transformando-se no que um autor chamou de propensão à irreligião e à infilosofia. Pois aí está o comunismo de Fidel. Um comunismo militante, tão religioso como o catolicismo jesuítico dos membros da Compania de Jesus, fundada por Inácio de Loyola, na Espanha, para combater a Reforma. Um conjunto de sólidos dogmas cunhados pela fé destinados a oferecer um caminho para a salvação da humanidade.

Santiago Dantas, um dos mais brilhantes intelectuais brasileiros dos anos dourados  escreveu um pequeno livro intitulado “Quixote, um apólogo do Século XX”. Aí ressalta os dois  grandes modelos de heroicidade ocidental que referimos, dispondo-os, aliás, como antagônicas e mostrando o personagem de Cervantes como o paradigma  cristão. Esqueceu-se, a propósito , de dizer, que Quixote, ao contrario de Cristo, não morre, retira-se, embora tenha neste personagem vida eterna. Mas tivesse Santiago Dantas vivido até nossos dias teria, certamente, visto em Fidel Castro a síntese destes paradigmas, que não chegou a perceber. Fidel, ao encarnar historicamente Quixote dá-lhe com a Revolução Cubana a obra que lhe faltou, deixando-lhe legado trágico, eivado de indagações. Mas ainda aí, uma semelhança: A Grande Obra da Revolução Cubana, nobremente conquistada com o objetivo de realizar a moderna utopia de uma sociedade sem aristocratas de sangue, dinheiro e prestígio, não passa  também de um grande fracasso. Mas um fracasso que se sustenta aos olhos de seu ideal igualitário jamais cumprido. Ironicamente, Fidel , na velhice, começa a se parecer de uma forma impressionante com o personagem Quixote. Não lhe faltam, sequer, os tropeços, o olhar franco e triste mergulhado na voz rouca de tanto falar, a envergadura alquebrada do fidalgo espanhol castigado pelo confronto de seus sonhos com a realidade.

Com Fidel, envelhecido mas honrado,  vão-se também os últimos suspiros do socialismo cunhado no Século XX  confirmando as escusas de Prometeu a Zeus  que o acusava por ter dado o fogo aos homens:
 “Lembrai  Senhor, que junto com o fogo, dei-lhes, também, vãs ilusões...”

Fidel, enfim, vive e viverá sempre, inspirando os idealistas à resistência, no sendeiro da utopia. Sua obra é a escrita  indelével da Revolução Cubana. 

Imortal!

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