quarta-feira, 26 de junho de 2013

Sayonara(QUARAÍ-RS) - EDUCAÇÃO - A DIDÁTICA E A FORMAÇÃO DE EDUCADORES



A DIDÁTICA E A FORMAÇÃO DE EDUCADORES

Continuação da Edição anterior:


2.2. 2º MOMENTO:



A afirmação do político e a negação do técnico: a contestação da didática

Principalmente a partir da metade da década de 70, a crítica às perspectivas anteriormente assinaladas se acentuou. Esta crítica teve um aspecto fortemente positivo: a denúncia da falsa neutralidade do técnico e o desvelamento dos reais compromissos político-sociais das afirmações aparentemente "neutras", a afirmação da impossibilidade de uma prática pedagógica que não seja social e politicamente orientada, de uma forma implícita ou explícita. Mas, junto com esta postura de denúncia e de explicitação do compromisso com o "status quo" do técnico aparentemente neutro, alguns autores chegaram à negação da própria dimensão técnica da prática docente.

"Há uma suposição firmada entre os críticos do 'saber fazer' de que a dimensão de eficácia do trabalho pedagógico é, definitivamente, uma invenção do pragmatismo pedagógico. 

Dessa forma todas as técnicas e meios pedagógicos são produtos da burocracia e instrumentos do poder dominador exercido pelo professor. (...) Há um consenso tácito de que as noções de 'eficácia', racionalidade, organização, 'instrumentalização', 'disciplina', estão indissoluvelmente ligadas ao modelo burocrático capitalista e, onde existem, são restritoras dos processos de democratização da escola e da sociedade. (...)
A critiquice antitécnica é própria do democratismo e responde em boa dose pela diminuição da competência técnica do educador escolar. A ênfase no saber ser, sem dúvida fundamental para se definir uma postura crítica do educador frente ao conhecimento e aos instrumentos de ação, não pode dissolver as outras duas dimensões da prática docente, o saber e o saber fazer, pois a incompetência no domínio do conteúdo e no uso de recursos de trabalho compromete a imagem do professor-educador. Tornar nossa prática ineficiente põe em risco os próprios fins políticos dessa prática".
(Libâneo, 82, p. 42-43)

Essa tendência reduz a função da Didática à crítica da produção atual, geralmente inspirada nas perspectivas anteriormente mencionadas.

A afirmação da dimensão política da prática pedagógica é então acompanhada da negação da dimensão técnica. Esta é vista como necessariamente vinculada a uma perspectiva tecnicista. Mais uma vez as diferentes dimensões do processo de ensino-aprendizagem são contrapostas, a afirmação de uma levando à negação das demais. Afirmar a dimensão política e,conseqüentemente, estrutural da educação,supõe a negação do seu caráter pessoal. 

Competência técnica e política se contrapõem. Neste momento, mais do que uma didática, o que se postula é uma antididática.

3. DE UMA DIDÁTICA INSTRUMENTAL A UMA DIDÁTICA FUNDAMENTAL

No momento atual, segundo Salgado (82), ao professor de Didática se apresentam duas alternativas: a receita ou a denúncia. Isto é, ou ele transmite informações técnicas desvinculadas dos seus próprios fins e do contexto concreto em que foram geradas, como um elenco de procedimentos pressupostamente neutros e universais, ou critica esta perspectiva, denuncia seu compromisso ideológico e nega a Didática como necessariamente vinculada a uma visão tecnicista da educação.

Certamente, na maior parte das vezes, o ensino de Didática está informado por uma perspectiva meramente instrumental.

Este enfoque limitado reflete-se nos livros sobre o assunto que são, em geral, pobres, restringindo-se ao enunciado de "receitas", com uma fundamentação teórica insuficiente e inconsciente.
(Alvite, 81, p.52)

Mas a crítica à visão exclusivamente instrumental da Didática não pode se reduzir à sua negação. Competência técnica e competência política não são aspectos contrapostos. A prática pedagógica, exatamente por ser política, exige a competência técnica. As dimensões política, técnica e humana da prática pedagógica se exigem reciprocamente. Mas esta mútua implicação não se dá automática e espontaneamente. É necessário que seja conscientemente trabalhada. Daí a necessidade de uma didática fundamental.

A perspectiva fundamental da Didática assume a multidimensionalidade do processo de ensino-aprendizagem e coloca a articulação das três dimensões, técnica, humana e política, no centro configurador de sua temática.

Procura partir da análise da prática pedagógica concreta e seus determinantes.

Contextualiza a prática pedagógica e procura repensar as dimensões técnica e humana, sempre "situando-as".

Analisa as diferentes metodologias explicitando seus pressupostos, o contexto em que foram geradas, as visões de homem, de sociedade, de conhecimento e de educação que veiculam.

Elabora a reflexão didática a partir da análise e reflexão sobre experiências concretas, procurando trabalhar continuamente a relação teoria-prática.

Nesta perspectiva, a reflexão didática parte do compromisso com a transformação social, com a busca de práticas pedagógicas que tornem o ensino de fato eficiente (não se deve ter medo da palavra) para a maioria da população. Ensaia. Analisa. Experimenta. Rompe com a prática profissional individualista. Promove o trabalho em comum de professores e especialistas. Busca as formas de aumentar a permanência das crianças na escola. Discute a questão do currículo em sua interação com uma população concreta e suas exigências etc.

Este é, a meu ver, o desafio do momento: a superação de uma Didática exclusivamente instrumental e a construção de uma Didática fundamental.

Referências
ALVITE, M. M. C. Didática e psicologia: crítica do psicologismo na educação. São Paulo: Loyola, 1981.
LIBÂNEO, J. C. Saber, saber ser, saber fazer, o conteúdo do fazer pedagógico. Revista da ANDE, ano 1, n. 4, 1982.
MATTOS, L. A. de. Sumário de Didática Geral. Rio de Janeiro: Aurora, 1957.
OLIVEIRA, M. R. N. S. O conteúdo atual da Didática: um discurso da neutralidade. Tese de Mestrado em Educação. UFMG, 1980.
SALGADO, M. U. C. O papel da didática na formação do professor. Revista da ANDE, ano 1, n. 4, 1982.
SAVIANI, D. Correntes e tendências da educação brasileira. In: TRIGUEIRO, D. Filosofia da Educação Brasileira. INEP, 1980.
SOARES, M. Travessia - Memorial apresentado à Faculdade de Educação da UFMG como parte dos requisitos para a Inscrição e Concurso de Professor Titular. Belo Horizonte, 1981.
Fonte
CANDAU, Vera Maria (org.). A Didática em Questão. Petrópolis: Vozes, 1983. Disponiblizado inicialmente na Biblioteca do SIAPE - Sistema de Ação Pedagógica


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