quinta-feira, 13 de junho de 2013

COLUNA DO PAPULO TIMM(Torres-RS) - Drops junho 13 - OUÇAM O QUE TEMOS A DIZER



Clique para abrir Drops Informativo Diário 


            "Ouçam o que temos a dizer"

                                 Paulo Timm – copyleft – Torres RS – 13 junho 2013
A PRAÇA
                                            Castro Alves
A praça
A praça é do povo
Como o céu é do condor
É o antro onde a liberdade
Cria águias em seu calor
Senhor!
Pois quereis a praça
Desgraçada a populaça
Só a tem a rua de seu


 


Ainda chocado pelo mau gosto da Presidente Dilma em citar a passagem do Velho do Restelo, do  “Lusíadas”, para estigmatizar os que criticam o Governo como eternos pessimistas, volto-me às manifestações de rua que têm infestado o país no último mês, de Porto Alegre ao Nordeste. Antes, registro meu lamento que não tenha a Presidente, na terra do Pai do Língua no último dia 10, data máxima da lusofonia, que lembra a morte de Camões, sequer tocado na importância de sua obra. Ou que tenha aproveitado a ocasião para lançar um vasto programa de estímulo à leitura...
Começo lembrando o finado Roberto Freire, psicanalista, autor de “Sem Tesão não há Revolução”, para quem , numa sociedade injusta não há como ser radical sem cair na marginalidade. Isto para dizer que não são as manifestações urbanas esporádicas que me espantam, no Brasil. O que me espanta mesmo é que elas não ocorram diariamente convertendo-se em irredentismo. Por quê? Porque é na Rua que Mora o Acontecimento, trazido à borda do tempo como  sala de espera da problematização:

SALA DE ESPERA
                                         Cassiano Ricardo
Mas eu prefiro é a rua
A rua em seu sentido usual
Em seu oceano que é ter bocas e pés
Para exigir e para caminhar
A rua onde todos se reúnem num só ninguém coletivo
Rua do Homem como deve ser
Transeunte, republicano, universal
Onde cada um de nós é um
Pouco mais dos outros
Rua da reinvindicação , onde mora o acontecimento

E por outra razão muito simples: O Brasil é uma das sociedades mais injustas do mundo, apesar de ter sido sempre, uma das economias mais prósperas. Há 500 anos estamos no top-10 e todo mundo finge que isso só aconteceu recentemente. Só nos dez maiores PIBs do mundo estamos há 50 anos. Mas foi sempre um progresso  de benefícios religiosamente concentrados na vértice de uma pirâmide social que evoluiu (?) de genocida dos nativos na fase “exploratória”,  mais tarde, escravocrata, até 1888, depois oligárquica, até Vargas, e finalmente, cínica, isto é “liberal”. Nesta última fase passou de 60 para 200 milhões de habitantes, atravessando diversos regimes políticos e tonalidades de Governo. Os mais pobres deram conta do recado divino: cresceram e se multiplicaram, não sem uma mãozinha dos Governos na forma de parcos programas sociais, desde o “Taça com Pão e Manteiga”, tabelado, obrigatório, passando pelos “Institutos”, último deles o INSS, até os atuais programas de Bolsa Família. Podemos até arriscar que nosso povo é filho das campanhas de vacinação e  dos antibióticos, que reduziram sensivelmente a taxa de natalidade no século XX, e da “farinha de pau”. Ou , como diria Bautista Vidal, desta bênção dos trópicos em  forma de biomassa que transforma a energia solar em energia humana. Há , no Brasil, a despeito da incorporação nos últimos tempos de 20 a 30 milhões de gentes na dita classe média ( diga-se de passagem, por baixo dela...), metade da população que não ganha sequer meio salário mínimo por mês. (Este é o verdadeiro fantasma que ronda e amedronta autoridades, elites e intelectuais neo-fascistas que clamam pela “Ordem”).  Ainda assim, mesmo sem renda, pagam impostos, pois,entre-nós, como gostava de referir Florestan Fernandes, cerca de 75% dos impostos arrecadados são de origem indireta. Outros 25%, paga-o a classe média com o Imposto de Renda não menos odioso, porque penaliza enormemente quem ganha até dez salários mínimos, como se isso fosse um ganho fantástico. Rico mesmo, que ganham mais de 30 mínimo até bilhões, no Brasil, não paga imposto nenhum e ainda reclama, inventando essa fraude do IMPOSTÔMETRO em São Paulo, que a papagaiada repete sem maiores indagações. Ao final, depois de raspar o suor do povo mais pobre com tributos o Governo Federal se compraz em gastar quase metade do que arrecada com o pagamento de juros de dívida pública, numa taxa de juros exorbitante. Quem duvidar consulte a página da DIVIDA CIDADÃ : www.auditoriacidada.org.br / Veja-se que não estou criticando ESTE Governo. Estou falando sobre o caráter injusto da sociedade brasileira que tem suas raízes na Matriz Colonial e que a muito custo consegue se modernizar, mas sem bolir com o controle dos ativos patrimoniais que se refletem na apropriação por cerca de 5 mil famílias de metade da renda gerada no país. É a Máquina do Mundo, do Drummond :
a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.
Ora, num cenário social destes a Guerra Civil desloca-se das barricadas para a violência urbana desenfreada nas grandes metrópoles, que é onde se concentra a população e a pobreza. Mas a violência não é apenas dos marginais. Ela está inscrita na vulnerabilidade social das famílias que habitam as periferias: insuficiência de emprego e renda, desagregação doméstica com espancamentos de crianças, mulheres e velhos diariamente, violações sistemática de moças que atravessam amedrontadas ruas sem iluminação nem calçadas, transportes públicos sofríveis, convivência com o tráfico e suas vítimas. Na verdade está por todos os lados...

Exploradores do medo


Eles  ficam  nas suas torres
Lívidas,  lívidas,
Eles ficam nas suas torres,
Que são  de aço, não de marfim.
Eles ficam nas suas torres,
Que são de aço, não de marfim.
Eles ficam nas suas torres
E, lá dentro, são cordiais,
São corados, gesticulam
E ensaiam diante do espelho.

Dorme, operário,
Que o bicho- papão
Te espera lá fora

Com a bomba na mão.

Dorme, estudante,
Dorme, senão
Vem a moura- torta
Com a foice na mão.

Dorme, povo,
Dorme, nação
Dorme e os teus cuidados
Deixa em nossa mão.

Eles ficam nas suas torres
Irradiando o ritornelo.
Eles comem do vermelho
E nos servem do amarelo.

As explosões urbanas que assistimos nos últimos dias não é nada frente aos pequenos assassinatos que ocorrem diuturnamente nas cidades brasileiras. Lógico que isto apavora a classe média mais assentada e tradicional que preferiria ver o Brasil num sendeiro de ORDEM E PROGRESSO, como frisa a bandeira . Mas ela fala do camarote de seus privilégios, com medo da “cruz do momento”, sem se dar conta de que sãos as ruas e praças que anunciam mudanças, não o Jornal Nacional:

Preferimos a ruina à mudança,
Preferimos morrer em nosso medo
Do que subir a cruz do momento
E deixar nossas ilusões morrerem
                                                  W.B.Yeats – Poeta – in The Age of Anxiety Premio Pulitzer, 1948)

 E nem se pode imaginar que os distúrbios consistem na melhor forma de obter resultados. Mas não se trata disso. Trata-se de entender o Brasil no que ele verdadeiramente é, sem retoques. Contrariamente ao Poeta Maior que se indagava incrédulo se “O Brasil Existe?” , ele existe sim, e é esse que aí está e que ruge esporadicamente avisando que ainda é o Rei da Floresta. Claro que nosso caso não tem nada a ver com a Primavera Árabe, com o Outono Turco ou qualquer coisa que o valha. Há tempos nos cansamos de perguntar o que é exatamente o que identifica o Homem e as Sociedades. Rigorosamente, nada. O que nos identifica é exatamente a pluralidade. E dessa pluralidade emergem inevitáveis conflitos, apesar das sociedades sempre quererem vender sua imagem de eternidade. Que nada! Elas mudam. Mas não mudam no ritmo tão desejado pela Ordem, mesmo em tempos atuais. Às vezes, pelo obliterado imperativo do Amor ( velha consigna positivista : O Amor por princípio, a Ordem como meio e o Progresso como fim) fala mais alto. Ora, dirão alguns os conservadores: “Isto é amor?”. Pois sim! Não o amor entrevado das fábulas senis, mas o Amor como expressão de vitalidade da juventude, sempre inquieta, sempre desejosa de ampliar fronteiras e atravessar o mundo como um trunfo. Não o amor idealizado do encanto milenarista, mas o Amor como toque de uma modernidade secularizada que não aceita a eternização das diferenças como herança da natureza. Não o amor como artefato ornamental de grandes espetáculos e objetos de desejo inacessíveis,   mas o Amor ao alcance dos lábios que saciam a sede na fonte cristalina.  
                                                   “Ouçam o que temos a dizer”
O que precisamos, enfim, no Brasil, não é sufocar as manifestações dos jovens.  Nem incentivá-las, até porque elas jamais o aceitariam, vez que genuínas. Mas compreendê-las pelo exercício da palavra. Escutá-los. E como tudo que começa em Poesia, em Poesia se encerra:

“Infinito é o sonho
Que, irrealizado,
Dorme em apoese”
Anderson Braga Horta, poeta brasiliense ,  in APOESE

Nenhum comentário:

Postar um comentário