segunda-feira, 3 de junho de 2013

COLUNA DO PAULO TIMM(Torres-RS) - Drops junho 03 - A MORTE E A MORTE DE BAUTISTA VIDAL



Drops junho 03 - A MORTE E A MORTE DE BAUTISTA VIDAL



Foi-se um grande brasileiro: Bautista Vidal

Morreu no sábado passado,  aos 78 anos , o físico baiano José Walter Bautista Vidal, ex-professor da Universidade de Brasília (UnB) e enaltecido como o grande incentivador do uso dos biocombustíveis no Brasil e, particularmente do PROALCOOL. Foi ele, na verdade, durante o Governo Geisel (1974-79) , à testa da área de pesquisa tecnológica, o  idealizador do Programa Nacional do Álcool, vindo a ter, em outro professor da UnB, Urbano Ernesto Stumpf (1916-1998), que desenvolveu o motor a álcool, importante colaborador. Bautista deixa inúmeros livros publicados em defesa da economia nacional, sempre enfatizando a necessidade da afirmação  da soberania do país, os quais continuarão ecoando sua voz altaneira na identificação dos   problemas brasileiros, sempre apontando  alternativas e  soluções. Dono de temperamento forte Bautista não poupava os políticos, nem menos Fernando Henrique Cardoso e Lula, os quais acusava de não enfrentar com coragem o cerne do desenvolvimento brasileiro que é a questão energética. Crítico da Era do Petróleo, viveu na carne, como Secretário de Tenologia Industrial, a primeira crise do petróleo, nos anos 70, quando o preço do barril saltou de $US 2,50 o barril para mais de $US 10. Desde então deu início à sua pregação a favor do salto energético para os biocombustíveis, mas sempre ressaltando tratar-se não só de uma opção tecnológica mas um passo em direção à redefinição do modelo econômico fortemente concentrador de renda na pirâmide social e no sul industrializado. Via no álcool a possibilidade de redimir regiões depauparedas do país que poderiam encontrar no cultivo de matérias primas para a produção de energia um verdadeiro alento, eis que detentora de água em abundância, muito sol e áreas cultiváveis. Para ele o Brasil  era o único país do mundo capaz de dar este salto energético enterrando, de vez, a Era do Petróleo,  com uma energia limpa, renovável e fortemente redistributiva. Mas não acreditava que a PETROBRÁS pudesse liderar tal processo, em virtude de seu viés fortemente petroleiro. Sugeria, sempre, uma outra empresa que não concentrasse o processo produtivo, mas o estímulo para que cada Estado, cada Município deste imenso país, cada comunidade, se conscientizasse da necessidade da auto-suficiência energética e se voltasse à produção de biocombustíveis. Bautista não foi feliz em sua peroração. Vários Governos se sucederam sem lhe dar a devida atenção. Lula o escutou e chegou, até a se entusiasmar com a idéia. Foi quando saiu pelo mundo falando em biocombustíveis. Mas o anúncio da descobertas das jazidas do pré-sal, o levaram a mudar o discurso, certo de que ali estava um filão de rendimentos rápidos não só financeiros para o Estado, mas para a causa política que lidera. Mais uma frustração para Bautista. Contudo continuou, incansável, pelo país inteiro distribuindo sua eloqüente convicção na defesa do álcool e dos biocombustíveis. Até na minha modesta cidade de Torres, na fronteira do Rio Grande do Sul com Santa Catarina, esteve duas vezes, e deixou inúmeros adeptos que hoje lamentam sua morte.

Eu também lamento. Duplamente: como um simpatizante de seu discurso inovador, pouco enquadrado nas fórmulas das opções políticas em curso, no que repete outros grandes brasileiros de quem temos tanta saudade – Inácio Rangel e Darci Ribeiro - e como amigo, embora  distante. Fomos colegas de sala no IPEA, instituição de Planejamento e Pesquisa do Ministério do Planejamento, no início do Governo Figueiredo (1980-85). Ele havia saído do Ministério da Indústria e Comércio e voltara ao IPEA, preocupado com a ascensão de Delfim Neto ao poder, justamente à testa do Planejamento. Delfim, dizia sempre, é um canalha. A meu juízo, continua sendo, a despeito de ser um profundo conhecedor da economia brasileira e dono de respeitável formação acadêmica. Mas caráter nada tem a ver com ciência. Nem com ser bom condutor ao volante de um carro. É matéria de foro íntimo. Pois lá ficávamos, “de molho”, à espera dos acontecimentos que viriam a ser piores do que imaginávamos, naquela sala do décimo primeiro andar do Edificio BNDES em Brasília: Bautista Vidal, Marco Antonio Campos Martins, economista brilhante, PhD por Chigado, Marco Antonio Dias Pontes, jornalista e eu.  Posso dizer que foram os meses mais produtivos da minha vida profissional no IPEA pelo que aprendi com Bautista e Marco Antonio. Eu, menos acadêmico e mais militante, fui o primeiro a ser defenestrado sumariamente. Me expusera demais ao lado de Brizola no ato de fundação do PTB, depois PDT.  Fui demitido em março de 1980. Bautista e Marco Antonio Campos Martins pouco tempo depois. Depois disso, encontramo-nos muitas vezes nos Seminários da Universidade de Brasília durante a gestão de Cristovam Buarque na Reitoria, quando estimulava encontros de debates sobre Política e Economia no Brasil.

Guardarei, portanto, na minha lembrança a imagem de um homem forte, convicto de suas ideias, capaz não só de morrer pela causa da soberania nacional, mas, sobretudo, de viver intensamente por ela, mesmo à custa de ficar, muitas vezes, marginalizado pelas correntes dominantes de opinião.

O Brasil lamenta tua passagem Bautista. Mas Tua voz continuará por muito tempo através de teus inúmeros livros. O país perde um de seus melhores e mais dignos concidadãos. Mas podemos dizer que o Brasil, doravante, não só dispõe de  água, sol e terras cultiváveis para dar o salto tecnológico do século, como o catalisador destes recursos na tua memória.

Nenhum comentário:

Postar um comentário