É verdade que o povo vota mal, com pouco critério na escolha
dos candidatos, a ponto de muitos não saberem em quem votaram nas últimas
eleições. Mas isto não é tudo.
Voltemos ao ano de 2002. O povo elegeu
Lula de maneira contundente, na convicção de ser o transformador contra
processo de privatização de empresas, na desvalorização das aposentadorias, nos
aviltantes salários pagos aos trabalhadores, na agiotagem internacional com
investimentos especulativos sobre a economia nacional, na submissão aos
interesses estrangeiros, na concentração de renda em mãos de poucos. Tudo o que fazia o governo Fernando Henrique
Cardoso era o que combatia o candidato e o PT, partido de sua base de alianças,
incluindo o repúdio ao famigerado Fator Previdenciário, instrumento
institucional responsável pela queda do valor real dos vencimentos de quem se
aposentara com mais de um salário mínimo.
O povo votou contra tudo aquilo em quem simbolizava a mudança,
o que atraiu nomes respeitáveis da vida pública nacional que há muito tempo
preconizava por essas transformações. Leonel
Brizola foi uma dessas vozes que atribuíam ao grupo lulista o condutor dos
novos rumos.
Para surpresa de todos, o novo governo seguiu literalmente a
mesma política sócio-econômica de FHC, e caiu até na prática dos crimes de
corrupção de seu antecessor, acusado de comprar parlamentares para aprovarem
sua reeleição no episódio que era a continuidade do Mensalão Mineiro, iniciado
por Eduardo Azeredo em 1998, em que ficou consagrada a atuação do intermediário
Marcos Valério, que também serviu de canal para o abastecimento do Mensalão
Petista, por isto consagrado pela mídia como valerioduto.
O Mensalão Petista tomou
as dimensões de escândalo com o assassinato sob tortura do ex-prefeito de Santo
André(SP), Celso Daniel, recheado com as denúncias do também mensaleiro Roberto
Jefferson.
A estratégia petista de formar o arco parlamentar de apoio ao
governo a troco de ministérios e demais cargos do alto escalão governamental
assemelhou-se aos recursos usados por FHC para alcançar a reeleição. São do
governo tucano o Bolsa Escola, Bolsa
Alimentação, o Auxílio Gás, que Lula
resumiu no Bolsa Família.
São semelhantes em tudo, menos no nível de instrução. Um sociólogo, ou outro
metalúrgico. Ambas as origens poderiam
sugerir tendências direcionadas à Justiça Social. Mas um e outro negaram suas origens, teóricas
ou de fato, e tomaram o caminho das conveniências pessoais. Preferiram servir
ao neoliberalismo econômico a implantar as políticas de distribuição de renda que fossem ao
encontro da justiça social.
O povo acertou quando votou em Lula, diante das frustrações
vindas desde a volta dos civis ao poder, a partir de Fernando Collor de Melo,
sob as emoções da Esperança. Em 2006, as
eleições se polarizaram entre José Serra – um clone de FHC – e Lula. Eram faces da mesma moeda. Para haver escolha de esperança, de mudança,
não havia mais opção. A mídia contribuiu
para essa polarização. Ambos, a essa
altura, representavam os interesses do Grande Capital. Outros que oscilaram no primeiro turno com
nuances de passarem ao segundo, eram sombras dos dois principais. Todos signatários do Consenso de Washington. Logo,
tinham o passaporte da Câmara de Comércio dos Estados Unidos, o visto da Casa
Branca, o beneplácito da FMI e o aval do Banco Mundial. O povo talvez não soubesse desses
detalhes. Em qualquer alternativa,
porém, seria trocar seis por meia dúzia.
Impedido legalmente de concorrer à reeleição, Lula encontrou
a ex-guerrilheira Dilma Roussef que também esqueceu o seu passado e aderiu ao
bloco, não sem antes passar pela Câmara de Comércio Ianque e até se tornou “garota
propaganda” nas telas de Rede Globo.
O povo erra mais quando fica indiferente do que quando vota.
Erra quando vende o voto ou aceita qualquer vantagem em troca. Vendendo, não tem força moral para cobrar dos
eleitos o cumprimento do seu dever. Estão quites corrupto e corruptor. Indiferença não é deixar de votar. Indiferença é se acomodar com os benefícios,
em forma de caridade, que humilham e negam a cidadania.
A indignação mesmo pacífica tem caráter de luta, de exigência
dos direitos, de inconformismo com a injustiça, com o abuso de poder.
Quando estadistas e políticos de princípios se tornam espécie
em extinção, os que restam – novatos ou antigos – se sentem muito confortados a
cobrar do povo os maiores impostos da América Latina para serem remunerados
como as figuras públicas mais caras do mundo, embora valham muito pouco ou
nada. Pois, além da sua remuneração revelada,
praticam a rapinagem nas fraudes de obras superfaturadas, resultantes de
licitações criminosas.
Quando o povo não tem opção, seu papel é mobilizar-se, botar
a boca no trombone, protestar, organizar-se em ações coletivas e pressionar os
seus dirigentes nas prefeituras, nas câmaras, no governo do estado, na
assembléia legislativa, na presidência da república e no congresso
nacional.
Nos países colonizados do Terceiro Mundo o capitalismo
fracassou, porque a concentração de riqueza marginaliza grandes parcelas da
sociedade. Mesmo quem trabalha tem baixa
renda, enquanto os especuladores que nada produzem se apoderam dos bens
produzidos pelos trabalhadores mal pagos e muito explorados. O sistema somente deu certo nos países de
mentalidade mais avançada e humanizada, onde a diferença de rendimento é
pequena de um para outro. E, por isto,
atingem elevados indicadores sociais, como Noruega, Austrália, EUA, Holanda,
Alemanha, Nova Zelândia, Irlanda, Suécia, Suíça, Japão, Canadá e outros mais.
Estes têm os 11 melhores IDHs – Índice de Desenvolvimento Humano - do mundo, com variações de 0,955 a 0,911. Quanto mais próximo de 1, melhor. O Brasil, essa potência que pretende ser a 5ª
maior do Planeta, encontra-se no humilhante 85º lugar, com 0,730, abaixo de
Peru(0,741) – 77, Venezuela(0,748) – 71, Costa Rica(0,773) – 62, México(0,775)
- 60, Panamá(780) – 59, Cuba(780) – 59, Uruguai(792) – 51, Argentina(0,811) –
45(Fonte: Relatório 2012 – Índice de Desenvolvimento Humano).
Quem vê a propaganda governamental, ignora esta
realidade. Por essas e outras razões,
deduzimos que nossa delicada situação social decorre das altas despesas com a
classe política em suas diversas formas: nepotismo, corrupção, ineficiência,
superfaturamento de obras. Tudo leva a
esses baixos indicadores sociais que refletem o péssimo estado da Educação, da
Saúde, da moradia, do preço dos alimentos, do vestuário e na qualidade de vida
como um todo.
O Brasil socializa a pobreza. Como exemplo vemos nossos
conjuntos residenciais, as chamadas casas populares, COHABs, Minha Casa Minha Vida, onde as unidades são
iguaiszinhas, de pouco espaço, sem chance de opção para quem quer ter na sua
morada o reflexo de sua identidade. As
cestas básicas também são padronizadas e a remuneração pelo trabalho é, de
maneira quase maciça, a mesma: um
subsalário mínimo R$ 678,00, correspondente a menos da quarta parte das
necessidades de uma família.
Já a riqueza é capitalizada.
Concentra-se nas mãos de uns poucos para ser distribuída em migalhas
para milhões de dependentes, ora de forma caritativa, ora como pagamento de
trabalho. A distribuição humilhante
coloca a grande massa em situação de semi-escravidão, porque, mesmo sabendo que
não dá, a pessoa tem que se conformar com o pouco, que parece melhor do que
nada.
Dizer que o povo não vota direito é muito relativo. Votar em quem, se, na maioria das vezes, os
atores em disputa são muito iguais e conduzidos a polarizar entre dois de
acordo com os interesses dominantes, com as manobras da mídia. As pesquisas de opinião são parte desse
instrumento de polarização, quando começa a fazer sondagens com muita
antecedência em torno de dois nomes aprovados pelo sistema. São nomes abeçoados.
O critério parece copiado dos Estados Unidos, onde somente
Republicanos e Democratas se revezam no poder. Ambos seguem a mesma
cartilha. Assim, procuram fazer no
Brasil, na presidência da república, nos estados e nos municípios. Se o povo seguir esse jogo, nada muda. As transformações reais têm que acontecer de
baixo para cima. Não há interesse nos
políticos mais caros do mundo de mudar coisa alguma.
Cabe ao povo mobilizar-se, debater em assembléias livres,
criar órgãos de comunicação, realizar propostas de transformações
institucionais e formalizar projetos de leis que mudem a Constituição, de
preferência com uma Assembléia Nacional Constituinte, exclusiva, composta de
pessoas limpas, probas, cultas, de notório saber e que não pertençam à classe
política dominante. E que os membros
dessa assembléia fiquem inelegíveis por, pelo menos 20 anos, para evitar legislarem
em causa própria. E o projeto dessa
constituição seja debatido durante um prazo razoável por todos os segmentos da
sociedade.
Se o povo praticar esse exercício de construir o novo, naturalmente
saberá votar e terá a quem escolher.
(Franklin
Netto – viscondedoriobrancominasgerais@gmail.com)
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